ZERO HORA - 22/02/12
Quando soube que Lindemberg Alves Fernandes havia sido condenado a 98 anos de prisão, senti um mal-estar que não soube de onde vinha. Óbvio que se ele tivesse sido absolvido, o mal-estar seria maior, porém 98 anos, num país onde ninguém fica preso por mais de 30, soou como provocação infantil. “Querem o fim de impunidade? Taí! Fartem-se!” A advogada de defesa do assassino disse que apelará da sentença, pois seu cliente merece e deve pagar pelos crimes que cometeu, mas sem servir de bode expiatório.
Meu mal-estar acabou sendo esclarecido através das palavras da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, em debate ocorrido em Brasília. Rosário alertou para a sexualização precoce e suas consequências, o que de certa forma tem relevância com o fato: Eloá, a vítima, começou a namorar Lindemberg aos 12 anos, numa relação consentida pelos pais.
Adolescentes vivendo experiências adultas é prática comum hoje. Parecem todos preparados para o prazer, mas na hora de enfrentar crises de possessão, rejeições e demais efeitos colaterais do amor, voltam a ser crianças indefesas, sem as ferramentas para refletir e agir de forma sensata. Nesse sentido, Lindemberg poderia abater esses 98 anos com os pais dele, e também com os pais de Eloá, comigo, com você, com todos que fazem parte de uma sociedade que parece não se incomodar com o fato de a ignorância estar ganhando tanto espaço.
Crimes passionais são recorrentes, acontecem com pobres e ricos, moços e velhos. O machismo ainda é praga e precisa ser combatido. Mas o ato insano de Lindemberg não foi provocado apenas por machismo, o que tornam exageradas as manifestações da secretária de Política para a Mulher, Eleonora Menicucci, que ao saber da condenação, declarou: “Que grande emoção, que grande vitória. Essa é uma grande notícia para o Brasil e para as mulheres”.
Prefiro me solidarizar com a reação preocupada e lúcida de Maria do Rosário, que enxerga a questão com mais amplitude: o crime desse rapaz, assim como tiroteios dentro de escolas, turismo sexual envolvendo menores de idade, tráfico de drogas ocorrendo abertamente nas ruas, adolescentes pilotando veículos sem habilitação, tudo isso é uma tragédia anunciada: os jovens estão sem um olhar vigilante. Rosário declarou: “Precisamos não só de governos mais atentos, mas de pais e mães mais atentos, cuidadores mais atentos, sociedade mais atenta”.
O que dói na sentença de 98 anos de Lindemberg é que essa “vitória” é na verdade a revelação do fracasso de todo um sistema familiar que não prioriza o bem-estar mental e físico de cidadãos em formação. Não é culpa dos pais quando os filhos erram, ninguém tem controle e responsabilidade sobre as atitudes dos outros, mas os desatinos proliferam quando há falta de orientação, de apoio, de exemplo, de limite, de estrutura. O resultado desse abandono é que estamos matando e morrendo por estupidez generalizada.
2 comentários:
Bem!
Concordo/endosso com/o comentário de MARTA MEDEIROS.
Mas, gostaria de acrescentar que além dos pais/sociedade, nossos meios de comunicação, aliada à propaganda, em geral, vêm, de certa forma, sistematicamente, vulgarizando não só a sexualidade, como também a criminalidade/marginalidade, corrupção, além da própria educação o que fica cada vez mais difícil aos pais, mais exigidos, nos tempos atuais, no trabalho/sustentação da família, ter o tempo/espaço necessário para filtrar/dialogar adequadamente, as informações e idéias que os filhos têm acesso junto à sociedade/meios de comunicação, etc., em detrimento com as informações da própria família.
A colunista marca um gol contra e entra na lista do espírito corporativista feminino.
Maria do Rosário, por hora, se consagra como a Ministra dos comentários em momentos inoportunos.
Postar um comentário