O sorriso de Lupi
LEONARDO CAVALCANTI
CORREIO BRAZILIENSE - 12/11/11
Ao divulgar a pauta dos jornais antes da publicação, o ministro tenta matar um dos fundamentos do jornalismo, o da exclusividade da informação. Os assessores deviam saber disso. Assim, poderiam demover o pedetista da esperteza em vazar dados tão caros à sociedade
O jornalismo tem códigos escritos e não escritos. Daqueles um dia redigidos, há o do direito ao sigilo da fonte, que, de tão relevante para a sociedade, está na Constituição. Foi posto ali para evitar que pequenos ou grandes tiranos obriguem repórteres a revelar o autor de uma informação.
Matérias jornalísticas são produzidas a partir de indicações de pessoas que, vez ou outra, precisam ser preservadas, caso contrário correm riscos, de maior ou menor grau. Por isso — e por conta da urgência e importância da notícia —, é razoável que repórteres publiquem informações em off.
Para o leitor pouco habituado ao universo jornalístico, é irrelevante listar reportagens produzidas a partir de informações dadas por fontes sigilosas. Os repórteres fazem tal coisa todos os dias, de forma corriqueira. Aqui, neste Correio, publicamos um bom exemplo disso na página 2 da última quinta-feira.
A reportagem Aos aliados do PDT, tudo apontou que o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem) é utilizado para turbinar filiados ao partido e atender interesses dos aliados do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Dois desses aliados foram assessores diretos do irreverente pedetista.
A maior parte dos recursos do Projovem vem do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), administrado pelo ministério. A verba é para atender jovens de 18 a 29 anos, com cursos de qualificação e bolsa de R$ 100. O dinheiro é repassado pela pasta a estados e prefeituras brasileiros.
A partir daí, prefeitos e governadores contratam organizações não governamentais (ONGs). Dirigentes dessas entidades contaram ao repórter Vinicius Sassine que o dinheiro era direcionado a aliados de Lupi. Perceba: nesse momento, a informação em off foi repassada para a apuração.
Com o cruzamento de dados, o repórter conseguiu mostrar os nomes e os estados dos políticos beneficiados com o programa. Entre eles, Flávia Morais, eleita deputada federal pelo PDT goiano. Antes, ela foi secretária de Trabalho de Goiás e acusada de compra de votos pelo Ministério Público Federal.
Ao longo de uma apuração, um repórter checa dados com fontes oficiais de informação e pede o que no jargão jornalístico é chamado de "outro lado". As assessorias de imprensa, por sua vez, têm papel fundamental. Podem, inclusive, oferecer elementos fortes o suficiente para "derrubar" a pauta.
Aqui, entra outro código, este não escrito, pois pressupõe princípios não apenas profissionais, mas também morais. Ao ter acesso às informações da reportagem, assessores devem defender a lisura, sem tentar desqualificar a pauta injustamente ou mesmo constranger jornalistas.
Não é isso o que vem ocorrendo na pasta do Trabalho.
Nos últimos três dias, o ministro tem usado um blog para responder a perguntas de repórteres e, assim, divulgar para a mídia o trabalho de apuração, antes mesmo que sejam apresentadas ao leitor. Reportagens em gestação do Correio, O Globo, Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo foram expostas.
Esperteza
Os pedidos de informações foram repassados à assessoria de Lupi para que o jornal melhor informasse o cidadão. Se tal ação vai fragilizar o ministro, o problema é dele, que não trabalhou de forma coerente. Ao contrário do que Lupi imagina, a única guerra aceita por um repórter é pela informação.
Ao divulgar a pauta dos veículos, Lupi tenta matar um dos fundamentos do jornalismo, o da exclusividade da informação até o momento em que é publicada. Algo que deve ser respeitado em qualquer circunstância. Os assessores do ministro deviam saber disso.
Assim, eles, os assessores, poderiam demover o ministro Carlos Lupi da esperteza em vazar informações tão caras à sociedade.
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