O pouco "verde" nas políticas industriais
PEDRO DA MOTTA VEIGA E SANDRA POLÔNIA RIOS
O ESTADÃO - 22/10/11
O tema da "economia verde" vem ganhando destaque na agenda de política doméstica e internacional. É um dos eixos da Conferência Rio + 20, que será realizada em junho de 2012. Mas, com as enormes dificuldades para avançar na esfera da negociação internacional, o aprofundamento dos esforços de enfrentamento da mudança climática e de transição para uma economia de baixo carbono parece depender cada vez mais das políticas domésticas das potências climáticas, entre as quais o Brasil.
Como se sabe, o Brasil apresentou compromisso voluntário de mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEEs) na COP-15, em Copenhague (dezembro de 2009), e vem empreendendo esforços para avançar no cumprimento dessa meta, principalmente por meio de ações para minimizar os desmatamentos na Amazônia. Se os esforços brasileiros de mitigação são palpáveis, menos óbvias são as iniciativas de apoio à transição para uma economia de baixo carbono e ao aproveitamento de oportunidades a ela associadas.
Até hoje, a articulação, no País, entre as agendas de competitividade industrial e de economia de baixo carbono parece não ter entrado no radar de agentes públicos e privados. Há uma desconexão entre as agendas de mitigação da mudança climática - centrada no tema do desmatamento - e de transição para uma economia verde como estratégia de desenvolvimento e de consolidação de novas vantagens comparativas.
Assim, não há um conjunto coerente de políticas para modificar a trajetória de evolução da economia numa direção menos intensiva em carbono, bem como para gerenciar a transição entre modelos técnico-produtivos e promover fontes de crescimento verde.
Mais do que isso, o sistema de incentivos econômicos vigente no Brasil apresenta tendências contraditórias quando avaliado à luz desse objetivo. A prioridade absoluta na área de política industrial é, hoje, o incremento quantitativo dos investimentos, da produção doméstica e de seu conteúdo nacional. Diante desse objetivo, as preocupações com a transição para a economia verde não parecem ter influência relevante sobre a política industrial e de inovação. Também a política de atração de investimento estrangeiro direto, crescentemente preocupada com o conteúdo nacional e o aporte tecnológico das inversões,não internalizou as preocupações ambientais e climáticas como condicionalidade para a concessão de incentivos.
A nova política industrial, lançada em agosto/2011, prevê o estabelecimento de mecanismos de apoio (supostamente financeiro, por meio do BNDES) ao desenvolvimento tecnológico e comercialização de bens de capital com selo de Eficiência energética do Inmetro e para linhas de equipamentos dedicados à redução de emissão de GEEs. Porém a mesma política define incentivos fiscais significativos para o setor automobilístico, condicionados a projetos de investimentos e inovação, mas não faz referência a condicionantes "climáticos".
As ainda mais recentes medidas de proteção à indústria automobilística nacional reforçam a constatação de que as preocupações ambientais e climáticas ainda não chegaram de fato à política industrial brasileira. Entre as condicionalidades impostas para que os fabricantes de automóveis no País tenham acesso aos benefícios de redução de IPI não há nenhuma menção à redução de emissões, Eficiência energética ou qualquer outra exigência que se possa classificar na agenda de economia verde. Todas as condicionalidades se referem a conteúdo nacional ou investimento sem inovação e pesquisa e desenvolvimento no País. Mesmo neste último caso, não se estabelece conexão entre inovação, tecnologia e preocupações ambientais.
Há, decerto, iniciativas inovadoras, especialmente no âmbito do BNDES e de suas linhas de financiamento, que - mais além das condicionalidades socioambientais exigidas das empresas - conferem tratamento relativamente favorável a investimentos ambientais. Mas tais iniciativas são ainda pontuais e amplamente minoritárias no âmbito das políticas industriais brasileiras.
PEDRO DA MOTTA VEIGA E SANDRA POLÔNIA RIOS: SÃO DIRETORES DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (CINDES)
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