O curandeiro e a CPMF
FRANCISCO DORNELLES
O Globo - 17/09/2011
No interior de Minas Gerais, nos anos 40, existia um curandeiro nas mãos de quem ninguém falecia de tuberculose.
Médicos de Belo Horizonte deslocaram-se para o interior do Estado perguntando ao curandeiro que medida ele adotava para ninguém morrer de tuberculose em suas mãos. O curandeiro respondeu: "Quando vejo que vai morrer, eu mudo o nome da doença."
Propostas, no momento, estão aparecendo no sentido de ser criada uma contribuição cumulativa, tendo como fato gerador a movimentação financeira e cuja base de cálculo é o valor dessa movimentação. Mas, como existe uma reação muito forte da sociedade contra a CPMF, os seus criadores, seguindo a lição do mencionado curandeiro, desejam batizá-la com o nome de Contribuição Social para a Saúde (CSS).
O que caracteriza o imposto ou a contribuição não é o nome, mas o fato gerador e a base de cálculo.
O artigo 154, inciso I e o artigo 195, § 4º, da Constituição, permitem que a União crie, por lei complementar, outros impostos e contribuições, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador e base de cálculo próprios de outros impostos e contribuições nela previstos.
Em decorrência desses princípios, contribuição de natureza cumulativa, independentemente do nome que lhe for dado, não pode ser criada por lei complementar, mas somente através de emenda constitucional, como, aliás, ocorreu nos casos em que a CPMF foi criada, recriada e prorrogada, nos governos dos presidentes Fernando Henrique Cardoso e Lula.
Até o ano de 1998, 80% da arrecadação da União provinham de dois impostos - o Imposto de Renda e o IPI, imposto seletivo e não cumulativo -, que atendiam a todas as regras de uma boa incidência.
O capítulo da Constituição dedicado à seguridade social abriu caminho para que a União, reduzindo o peso dos impostos cuja receita era compartilhada com estados e municípios, criasse uma série de contribuições, a maior parte delas de natureza regressiva e cumulativa, que hoje propiciam uma arrecadação maior que aquela derivada dos impostos. Foi no bojo dessas mudanças que foi criada a CPMF.
A CPMF tem o encanto da facilidade da cobrança. Mas é uma incidência retrógrada, regressiva, cumulativa, que recai sobre o consumo, o investimento, as exportações, que estimula a desintermediação bancária e que indiretamente alcança pessoas de mais baixa renda. É uma incidência tão rejeitada que até hoje nenhum governo concordou em retirar dela o nome de "provisória".
O importante no momento, entretanto, é que aqueles que desejam criar uma contribuição de natureza cumulativa, com qualquer propósito ou nome que lhe for dada, considerem o fato de que ela não pode ser criada por lei complementar, mas somente por emenda constitucional.
FRANCISCO DORNELLES é senador (PP-RJ).
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