terça-feira, agosto 23, 2011

VINÍCIUS TORRES FREIRE - Sexta-feira, duas vezes 13

Sexta-feira, duas vezes 13
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 23/08/11 

Economias ricas navegam por um mar de icebergs; finança espera discurso do presidente do Fed, na sexta


NA TARDE DE sexta-feira que vem, dia 26, duas vezes 13, o presidente do banco central dos EUA, Ben Bernanke, fará um discurso muito esperado pela finança mundial.
Mas os próprios porta-vozes e outras figuras falantes da finança palpitam que Bernanke não diria muita coisa, nem teria como, em sua apresentação em Jackson Hole, cidadezinha do Wyoming que sedia um seminário econômico muito importante, patrocinado pelo Fed. De fato, a baderna da economia do mundo rico é tamanha que um discurso, um homem, ainda que presidente do Fed, ou mesmo o próprio Fed não teriam a capacidade de anunciar providência redentora.
Porém, a economia mundial não estava muito melhor em agosto de 2010. Foi quando Bernanke na prática anunciou que o Fed daria início à fase dois do "quantitative easing", relaxamento monetário, o QE2. Apenas a política de taxa de juros zero não reanimara a economia dos EUA. Além do mais, tumultos de meio de ano, como a crise grega, derrubaram os ânimos econômicos. O crescimento dos EUA parecia embicar para baixo de novo.
O QE2 começaria em novembro, quando o Fed passaria a comprar títulos de longo prazo da dívida pública americana. Isso, na prática, tende a derrubar as taxas de juros longas (e de financiamentos imobiliários, por exemplo) e faz com que aumente a quantidade de recursos emprestáveis nos bancos.
No QE1, na explosão da crise de 2008-2009, o Fed comprara qualquer título, até de empresas, um desvio escalafobético das funções de qualquer BC. No dizer sarcástico de Maria da Conceição Tavares, o Fed então descontava até duplicatas.
Apenas a dica de que haveria QE2 levou os investidores grandes às compras. A partir de setembro as Bolsas subiram, a especulação com commodities vicejou, subiram as moedas-commodities (de países dependentes de commodities e mais arrumadinhos, como o Brasil). Haveria dinheiro barato e abundante para fazer aposta em ativo de risco.
A economia real dos EUA reagiu com um suspiro fraco de ânimo ao QE2. O consumo subiu pouco, mas juros menores permitem refinanciamento de dívidas. Famílias endividadas não têm como comprar muito mais. O aumento do preço dos ativos financeiros anima também o consumidor, que sente estar menos pobre (ou, até 2008, mais rico).
Parecia então que a recuperação econômica viria. Pelo menos era isso que alardeavam os povos dos mercados (e o Fed também). A conversa fiada colou, mesmo com o horrível desemprego, com as dívidas públicas saindo pelo ladrão etc. Agora, estamos em meio a outra reação exagerada dos povos das finanças. Sim, soube-se agora que a recessão nos EUA foi pior do que se imaginara; que o crescimento de 2011 estava sumindo. Houve o previsível retorno da crise da dívida europeia. Houve a maluquice da crise do teto da dívida americana. Mas não sabemos ainda se virá nova recessão nos EUA e na Europa.
No entanto, o governo de Barack Obama não sabe o que fazer para tentar tirar o país da pasmaceira. Os indecisos e divididos governos europeus estão cozinhando nova erupção da crise da dívida, já agora em setembro. Os Titanics econômicos de EUA e Europa navegam na direção de um mar de icebergs. O Fed, sozinho, não vai virar o leme.

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