Manipulando Pequim
MATIAS SPEKTOR
Folha de S. Paulo - 05/05/2011
As novas forças que atraem o Brasil para a órbita da China são difíceis de resistir e reverter. Se o Brasil não aprender rapidamente a influenciá-las em benefício próprio, perderá a capacidade de escolha e será vítima de circunstâncias que não consegue controlar.
A recente visita presidencial pôs em evidência alguns desses novos obstáculos. O primeiro é a crescente desigualdade de poder entre os dois países: os chineses podem aceitar ou ignorar demandas brasileiras quando lhes convém e ao ritmo de sua escolha.
Importantes interesses nacionais se chocam. Seja em comércio, finanças, proliferação nuclear, direitos humanos ou mudança do clima, a divergência, já grande, tende a crescer. Em lugares como a América do Sul e a África lusófona, onde o Brasil ensaia incipiente jogo de cintura global, as iniciativas chinesas são muitas vezes competitivas ou desafiadoras.
O problema é ainda mais complexo quando se trata de moldar uma nova ordem global.
Sem dúvida, a ascensão chinesa mitiga a arrogância americana no mundo e ajuda a reabrir grandes questões que o "Consenso de Washington" parecia haver encerrado para sempre. A China também está forçando a reforma de instituições como FMI, Banco Mundial e o regime internacional de ajuda para o desenvolvimento.
E ninguém duvida de que, sem a China, não haveria Brics nem G20.
Mas a China não está disposta a montar uma frente reformista comum. Ela está hoje mais satisfeita que o Brasil e tem mais a perder com revisões profundas da situação. Na principal proposta brasileira de adaptação institucional, a reforma da ONU, a China não está disposta a avançar nem se sente pressionada a fazê-lo.
Por fim, crescem a passo alarmante na sociedade brasileira as vozes anti-China. Não se trata de um lobby organizado, mas são argumentos capazes de moldar atitudes públicas. Denuncia-se a China como indutora da desindustrialização e como ameaça à soberania sobre nossos recursos naturais.
Desconfia-se das motivações por trás de qualquer investimento oriundo de Estado autoritário, centralizado e com grande apetite geopolítico.
A sinofobia é um perigo real para o Brasil porque cega o público, mina o debate inteligente e limita o espaço de manobra de empreendedores e de governantes.
Mais do que isso, pode castigar uma relação bilateral que ainda não conta com instituições resistentes sobre as quais se escorar.
Hoje, Brasília não tem os instrumentos para controlar danos em Pequim. Temos acesso pífio às altas rodas chinesas de poder e de influência. Não temos especialistas no tema nem os centros acadêmicos para produzi-los.
Não há esforço sistemático de marketing nem propaganda ou lobby brasileiro naquele país.
O engajamento em instituições internacionais é parco e depende ainda do talento e interesse de diplomatas individuais.
Nenhuma das tendências acima é irreversível. Ao contrário, se a presidente Dilma Rousseff atuar agora, poderá transformar a situação antes do fim deste mandato.
Enquanto a coisa permanecer como está, o Brasil fica no pior dos mundos. Sem canais e instrumentos efetivos para manipular o processo decisório em Pequim, não consegue tirar vantagem máxima quando segue a China a reboque.
Tampouco consegue se opor e resistir às pressões chinesas quando elas demandam resposta.
O Brasil do século 21 não pode mais se dar ao luxo de ficar sem política coordenada para tirar vantagens da China e mitigar os custos que certamente virão.
A recente visita presidencial pôs em evidência alguns desses novos obstáculos. O primeiro é a crescente desigualdade de poder entre os dois países: os chineses podem aceitar ou ignorar demandas brasileiras quando lhes convém e ao ritmo de sua escolha.
Importantes interesses nacionais se chocam. Seja em comércio, finanças, proliferação nuclear, direitos humanos ou mudança do clima, a divergência, já grande, tende a crescer. Em lugares como a América do Sul e a África lusófona, onde o Brasil ensaia incipiente jogo de cintura global, as iniciativas chinesas são muitas vezes competitivas ou desafiadoras.
O problema é ainda mais complexo quando se trata de moldar uma nova ordem global.
Sem dúvida, a ascensão chinesa mitiga a arrogância americana no mundo e ajuda a reabrir grandes questões que o "Consenso de Washington" parecia haver encerrado para sempre. A China também está forçando a reforma de instituições como FMI, Banco Mundial e o regime internacional de ajuda para o desenvolvimento.
E ninguém duvida de que, sem a China, não haveria Brics nem G20.
Mas a China não está disposta a montar uma frente reformista comum. Ela está hoje mais satisfeita que o Brasil e tem mais a perder com revisões profundas da situação. Na principal proposta brasileira de adaptação institucional, a reforma da ONU, a China não está disposta a avançar nem se sente pressionada a fazê-lo.
Por fim, crescem a passo alarmante na sociedade brasileira as vozes anti-China. Não se trata de um lobby organizado, mas são argumentos capazes de moldar atitudes públicas. Denuncia-se a China como indutora da desindustrialização e como ameaça à soberania sobre nossos recursos naturais.
Desconfia-se das motivações por trás de qualquer investimento oriundo de Estado autoritário, centralizado e com grande apetite geopolítico.
A sinofobia é um perigo real para o Brasil porque cega o público, mina o debate inteligente e limita o espaço de manobra de empreendedores e de governantes.
Mais do que isso, pode castigar uma relação bilateral que ainda não conta com instituições resistentes sobre as quais se escorar.
Hoje, Brasília não tem os instrumentos para controlar danos em Pequim. Temos acesso pífio às altas rodas chinesas de poder e de influência. Não temos especialistas no tema nem os centros acadêmicos para produzi-los.
Não há esforço sistemático de marketing nem propaganda ou lobby brasileiro naquele país.
O engajamento em instituições internacionais é parco e depende ainda do talento e interesse de diplomatas individuais.
Nenhuma das tendências acima é irreversível. Ao contrário, se a presidente Dilma Rousseff atuar agora, poderá transformar a situação antes do fim deste mandato.
Enquanto a coisa permanecer como está, o Brasil fica no pior dos mundos. Sem canais e instrumentos efetivos para manipular o processo decisório em Pequim, não consegue tirar vantagem máxima quando segue a China a reboque.
Tampouco consegue se opor e resistir às pressões chinesas quando elas demandam resposta.
O Brasil do século 21 não pode mais se dar ao luxo de ficar sem política coordenada para tirar vantagens da China e mitigar os custos que certamente virão.
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