Limpando as fichas
LUIZ GARCIA
O GLOBO - 25/03/11
Nas discussões e julgamentos sobre a Lei da Ficha Limpa vale a pena - principalmente em face da mais recente decisão do Supremo Tribunal Federal - não esquecer um dado fundamental: não há registro de qualquer outro projeto de lei que, sem produzir qualquer benefício direto e concreto para o bem-estar do cidadão, tenha sido respaldado por manifestação tão inequívoca e maciça de apoio da sociedade.
A Lei da Ficha Limpa nasceu de um movimento social absolutamente sem precedentes na história política do Brasil. Principalmente por isso, é decepcionante o resultado da votação do Supremo, esta semana, determinando que a lei não valeu para as eleições do ano passado. Foi uma vitória para 29 candidatos fichas sujas.
Não se pode, ou não se deve, discutir a legitimidade da decisão. O STF pode ter razões que o coração da opinião pública desconhece, mas são - pelo menos, nenhum especialista disse algo em contrário - motivos juridicamente respeitáveis. O principal deles é o de que o artigo 16 da Constituição não permite mudanças na legislação eleitoral no ano anterior ao das eleições. Registre-se que cinco ministros do Supremo tiveram opinião diferente.
E nenhum ministro colocou em dúvida a legitimidade da lei: o que se discutiu foi exclusivamente o início de sua aplicação. Os defensores da validade da lei já nas últimas eleições argumentaram que estavam em confronto dois artigos da Constituição: o que protege a honestidade na vida pública e aquele que determina o momento em que uma lei começa a valer. Deve-se reconhecer que o artigo 16 da Constituição determina que normas eleitorais não podem ser criadas a menos de um ano antes de eleições. Mas cinco dos onze ministros consideraram que essa exigência não seria mais forte do que a necessidade de moralizar o processo eleitoral.
Para o eleitor que não entende dessas coisas o melhor argumento seria bem simples: moralidade, quanto antes, melhor. E a opinião pública pode ir se preparando para uma segunda batalha: a discussão sobre se podem ser punidos pela lei candidatos que se portaram mal antes que ela existisse.
É bem provável que essa questão tenha de ser decidida pelo Supremo. Pelos votos na decisão desta semana, o STF provavelmente ficará contra os fichas sujas - e a interpretação jurídica do processo eleitoral coincidirá com a vontade da opinião pública.
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