sexta-feira, março 25, 2011

CELSO MING

Continua aquecido
CELSO MING

O ESTADO DE SÃO PAULO - 25/03/11

Quem olha de relance para a curva do desemprego que vai no gráfico ao lado pode ficar com a impressão de que a atividade econômica está em retração no Brasil. Mas é o contrário que está acontecendo.
A economia continua em franco crescimento. O que mudou foi apenas a velocidade. No ano passado o PIB avançou 7,5% e, neste ano, terá mais alguma coisa entre 4,0% e 4,5%.
O desemprego chegou ao seu ponto mínimo em dezembro, com 5,3%. Subiu para 6,1%, em janeiro, e aumentou mais em fevereiro, para 6,4%. Mas está longe de indicar uma piora das condições do mercado de trabalho.
A população ocupada no último mês, aponta o IBGE, estava em 22,2 milhões, a mesma de janeiro. No período de 12 meses terminado em fevereiro, a economia brasileira teve um aumento de 515 mil ocupados (mais 4,1%).
Salvaguardadas as diferenças regionais, as condições hoje são muito próximas do pleno emprego. O mercado de trabalho continua pressionado. Faltam engenheiros, pedreiros, pintores, soldadores, eletricistas - a lista é enorme. O setor com maior redução de ocupação foi o de serviços domésticos. Provavelmente, graças a migração de mão de obra para a indústria ou para o setor de serviços, cujas proporções dentro do PIB crescem ano a ano.
Na Carta Ibre, a ser divulgada nesta segunda-feira, a revista Conjuntura Econômica, da Fundação Getúlio Vargas, avalia que a oferta de trabalho vai se expandindo 1,8% ao ano, acima do crescimento da população economicamente ativa, de 1,5% ao ano. E que esse é um fator limitador do crescimento econômico futuro no Brasil (crescimento potencial).
Não é o único. A poupança doméstica continua baixa demais, o investimento está insuficiente, em torno de 19% do PIB, quando teria de ser de alguma coisa em torno de 24%. Isso exige mais importação de poupança e investimentos.
E tem essa cavalgada dos preços que, medida como custo de vida (IPCA), ameaça ultrapassar os 6% em 12 meses. A inflação elevada demais que ataca a economia é tanto o resultado do crescimento acima da capacidade das pernas quanto fator limitador do crescimento do período seguinte, pois exigirá, como já ocorre, uma política monetária (de juros) mais apertada, combinada com ajustes fiscais (cortes de despesas públicas), cujo resultado será a esperada desaceleração da atividade.
Este início de governo enfrenta um conjunto impressionante de surpresas. Ninguém imaginava na virada do ano que se espraiaria uma revolução na comunidade islâmica, com forte impacto sobre os preços do petróleo. Também não estava no radar de nenhum observador a disparada dos preços das commodities quando a economia dos países ricos ainda está se convalescendo da crise financeira. Ninguém poderia prever as turbulências que agora estão flagelando a economia do Japão e os mercados de câmbio.
O avanço da inflação no País - esse, sim - estava mais previsível. Mas tanto o governo como o Banco Central preferiram fingir que não a viam, porque priorizaram a eleição da candidata oficial. Por isso, a conta a pagar ficou mais alta. E há dúvidas de que o governo Dilma tenha feito até agora o suficiente para virar esse jogo.

CONFIRA
Não doeu

O euro não ficou nem um pouco abalado com a rejeição do pacote de austeridade pelo Parlamento de Portugal. Por muito menos houve no ano passado enorme turbulência quando, primeiramente, a Grécia e, depois, a Irlanda passaram por problemas semelhantes.
Qual o recado?
Ainda não está claro o sentido dessa tranquilidade. Pode ser a certeza de que virá uma solução. Ou, então, pode ser o sinal de que a crise será tomada como oportunidade para deixar um país quebrar e servir de exemplo para os demais. 

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