Quem te ouviu, quem te ouve
Eliane Cantanhêde
FOLHA DE SÃO PAULO - 10/02/11
Lula voltou ontem a Brasília, pela primeira vez depois de descer a rampa do Palácio do Planalto, para a festa de hoje dos 31 anos do PT e para aproveitar o embalo e recuperar um pouco dos holofotes e microfones perdidos. Aliás, ele nem esperou chegar.
No Senegal, onde estava para o Fórum Social Mundial, ele descascou as centrais sindicais por estarem azucrinando Dilma por um salário mínimo maior do que os anunciados R$ 545. Segundo Lula, é "oportunismo" das centrais.
Vamos pensar juntos: depois de começar a carreira política como líder sindical, depois de ter passado boa parte da vida azucrinando governos e patrões por maiores salários, depois de ter feito todo o discurso pró-pobres e pró-assalariados e depois de ter virado presidente da República à custa de tudo isso, Lula tinha o direito de desautorizar e criticar sindicalistas pelo justo direito de reivindicação?
Ainda no Senegal, Lula apoiou os protestos contra o ditador Hosni Mubarak e acusou as "grandes potências" de terem sustentado o regime, quando, segundo ele, todo o mundo já sabia que era preciso instalar a democracia no Egito.
Vamos pensar juntos de novo: Lula tinha o direito de posar de humanista e de apontar o dedo contra quaisquer outros países, potências ou não, depois de dizer numa viagem oficial ao Egito, em dezembro de 2003, que "o presidente Mubarak é um homem preocupado com a paz no mundo, com o fim dos conflitos, com o desenvolvimento e com a justiça social?"
Lula deveria aproveitar melhor as férias, os estádios de futebol e a distância do poder. Não apenas porque vivia falando que ex-presidente tem de ficar calado, mas porque tudo o que fala se volta contra ele como um bumerangue.
Oportunismo por oportunismo, nada pode ser pior do que manifestar opiniões ao sabor do momento, da circunstância, dos interlocutores. É coisa típica de cara de pau.
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