O nó egípcio
ALON FEUERWERKER
CORREIO BRAZILIENSE - 10/02/11
As últimas semanas observam um gigantesco esforço intelectual global por explicações e previsões. Discutem-se semelhanças e diferenças entre as revoluções iraniana e egípcia. O DNA da Fraternidade Muçulmana (FM) é dissecado atrás de certezas absolutas sobre o futuro
As expectativas em relação à política dos Estados Unidos na crise do Egito correm o risco de repetir as frustrações hondurenhas: espera-se que a Casa Branca opere para fortalecer os inimigos dos Estados Unidos. Não acontecerá.
e alguém pretende promover uma revolução que atinja o centro dos interesses estratégicos de Washington será pouco sábio depender dos americanos para ter sucesso na empreitada.
Aconteceu em Honduras, e corre o risco de voltar a acontecer no Egito.
O status quo regional é fruto de pelo menos três guerras. A de Suez em 1956, a dos Seis Dias em 1967 e a do Yom Kipur em 1973. A primeira teve de estopim a nacionalização do canal. Na segunda Israel conquistou o Sinai, que precisou ser devolvido em consequência do resultado da terceira.
A resultante desses três conflitos mostrou-se altamente conveniente para os Estados Unidos. A soma de vetores produziu a paz, ainda que fria, entre os tradicionais inimigos locais.
Depois do bom resultado militar em 1973, o Egito deslocou-se da aliança com os soviéticos e obteve a paz e a estabilidade aproximando-se dos americanos, consolidando a hegemonia regional de Washington antes mesmo do fim da Guerra Fria.
Uma parte do prestígio e do poder das Forças Armadas egípcias decorre do protagonismo neste processo simultâneo de reconquista, pacificação e preservação da integridade nacional.
A luta dos egípcios pela democracia já teria colhido resultados bem melhores se não carregasse dúvidas sobre o desejo e a conveniência de alterar esse ordenamento. Dúvidas externas e internas. Essas últimas são as mais decisivas, pois serão os egípcios a definir o destino de sua revolução.
É nítido que os Estados Unidos procuram surfar simultaneamente em várias ondas, para defender sua posição. Há também outras pressões externas. Mas a chave da compreensão do impasse está no front interno.
Será que o Exército egípcio deseja uma nova liderança política que altere o equilíbrio de forças, que conduza o país a uma nova guerra?
Esse é o nó que falta desatar.
As últimas semanas observam um gigantesco esforço intelectual global por explicações e previsões. Discutem-se semelhanças e diferenças entre as revoluções iraniana e egípcia. O DNA da Fraternidade Muçulmana (FM) é dissecado atrás de certezas absolutas sobre o futuro.
Um método duvidoso. O pós-nasserismo que assinou e manteve por mais de três décadas os acordos de Camp David era e é herdeiro político do Gamal Nasser das guerras de 1956 e 1967, e também do Anwar Sadat de 1973. Mudadas as circunstâncias, muda junto a política.
A probabilidade de a FM ascender ao poder no Cairo depende menos agora do número de pessoas que colocará na rua e mais da capacidade de estar sintonizada no projeto nacional egípcio. Ou de atrair a maioria dos egípcios para um projeto de ruptura com a ordem regional.
Como talvez não seja capaz de dar essas garantias nem tem ainda força para a ruptura, a FM ensaia desenvolver o processo por etapas, negando neste momento que deseje o poder. Mas isso não resolve o problema. A FM precisará em algum momento explicitar seu projeto.
Ganhar o quê?
Os Estados Unidos desejam atrair o Brasil para um campo "antichinês" na disputa em torno do comércio mundial. Há terreno objetivo para a convergência, visto que ambos, americanos e brasileiros, sofremos com a desvalorização da moeda chinesa.
Sabe-se o que os americanos têm a ganhar: a abertura dos mercados chinês e brasileiro a seus produtos de maior valor agregado.
E nós, vamos ganhar o quê? As reivindicações brasileiras tradicionais concentram-se em mais mercado para a nossa agricultura. Será que até março Barack Obama terá reunido no Congresso força suficiente para ultrapassar as barreiras protecionistas? De longe, os chineses apenas observam, visto que dão as cartas e jogam de mão. Possuem o que ainda falta aos americanos do norte e do sul.
Poupança e competitividade.
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