As guerras de Mantega e o G20
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SÃO PAULO - 11/1/11
Franceses têm posições semelhantes às do ministro a respeito de "coordenação" econômica mundial
OS FRANCESES parecem acreditar a sério que podem fazer alguma coisa em relação à confusão monetária e financeira mundial, velha de quase 40 anos, mas que se tornou mais intensa na década passada, chegou ao ponto da catástrofe em 2008 e desde então anda crítica.
A França agora ocupa a presidência do G20. Funcionários franceses falam a sério de "reforma do sistema monetário internacional", de um "acordo mundial a respeito de fluxos de capitais desestabilizadores" e na "regulamentação" dos mercados de commodities, que flutuam loucamente não apenas devido a ciclos de demanda "real" mas de manias financeiras também.
Comparado aos funcionários franceses, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deixa de parecer, digamos, um otimista incorrigível ou voluntarista fantasioso, a depender do gosto do freguês.
Tal como Mantega, os franceses dizem que é necessário "reformar ou criar instituições" capazes de coordenar políticas econômicas e "limitar a desordem financeira" (fluxos de capitais alucinados e flutuações extremas das taxas de câmbio). Mas instituições que reflitam a "nova divisão do poder econômico" entre mundo desenvolvido e "emergentes". Dizem que esse é um acordo mais do que tácito entre União Europeia, Brasil, China e Índia.
Não haveria "guerra cambial" ou risco de "guerra comercial", como diz Mantega, nem a necessidade de acúmulos brutais de reservas em países emergentes se houvesse um acordo mundial que limitasse as variações excessivas de fluxos de capital, dizem os franceses.
Ainda neste mês, o governo francês deve anunciar as diretrizes de sua "proposta de acordo" global, para "relançar o G20". Na prática, o G20 teve alguma importância quando a crise de 2008 pegava fogo e todos os países, dos EUA à China, passando pelo Brasil, dispuseram-se a abafar diferenças em nome de um apelo publicitário à calma nas finanças do mundo. Desde então, o grupo e suas reuniões de cúpulas, como de hábito, são apenas um fórum no qual os países reafirmam civilizadamente suas diferenças e, no mais, EUA e China dão bananas diplomáticas aos apelos do resto do planeta.
No curto prazo, é certo que a "confusão monetária" mundial vai continuar. Ainda vai haver dinheiro "sobrando" no mundo até 2012, pelo menos, resultado de políticas monetárias frouxas nos EUA e Europa, além de deficit públicos ainda elevados nesses países. O dinheiro que sobra nesses lugares quase não encontra uso e/ou rentabilidade. Flui para os "emergentes", o que ajuda a provocar valorizações cambiais e/ ou excesso no crédito e na atividade econômica e, por fim, alguma inflação.
Americanos e europeus temem acabar com tais estímulos fiscais e monetários, pois tal atitude poderia provocar mais lentidão econômica ou mais estouros financeiros (como quebras de governos locais nos EUA, mais quebras de bancos e países na periferia europeia). Mas, em algum momento, os "mercados" vão se cansar do excesso. Os juros subirão. Haverá ainda confusão, mas então de sinal trocado: aperto monetário.
Enquanto isso, EUA e China aceitam as conversas sobre "coordenação econômica mundial" sem mexer um dedo nas suas políticas econômicas, que causam a descoordenação problemática e a confusão monetária mundial.
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