Riscos das atividades econômicas online
Oliver Fontana
O Estado de S.Paulo
A economia digital já atinge patamares significativos no Brasil. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2009 os internautas brasileiros somaram 67,9 milhões, ou seja, 35,4% da população. Em 2005 eram 31,9 milhões, o que representa um incremento de 112,9% em apenas quatro anos.
De acordo com recente levantamento da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (Câmara-e.net), o número de consumidores via internet já somou 20 milhões em junho deste ano, um aumento de 1.718% em relação ao 1,1 milhão de e-consumidores em 2001. Ainda segundo a mesma fonte, o faturamento total de e-commerce no Brasil pode ultrapassar a casa dos R$ 15 bilhões até este Natal, um impressionante crescimento de 1.264% desde o ano de 2001.
A qualidade das compras online também registrou melhora no período. Enquanto em 2001 o ticket médio das transações online era de R$ 205, em 2008 esse valor saltou para R$ 328, um incremento acumulado de 60%, com média anual de crescimento de 23% para o período. De 2001 a 2008, não só cresceu vertiginosamente o número de e-consumidores, mas eles também passaram a fazer compras de valor cada vez mais alto pela internet. Temos, assim, um sinal claro do aumento da importância desse canal de consumo, e de forma extremamente rápida.
Outro exemplo de pujança e amadurecimento do mercado digital brasileiro foi percebido, recentemente, pelo levantamento realizado pela PricewaterhouseCoopers para O Estado de S. Paulo, mostrando o aquecimento e a consolidação na área de tecnologia da informação. O setor contou 53 operações de fusão ou aquisição de participação societária no período de janeiro a setembro deste ano, 25% mais do que no mesmo período de 2009. O mercado de tecnologia da informação no País movimentou quase R$ 20 bilhões em 2009 e as projeções indicam que a cifra deve chegar a R$ 29 bilhões em 2013.
Percebe-se que os principais players do mercado estão procurando, por meio de fusões e aquisições, incrementar o tráfego e o faturamento de seus websites, bem como capturar valor gerado pelas sinergias entre negócios já existentes, como, por exemplo, redução de custos administrativos, de marketing e logísticos. Outros interesses que estimulam esta onda de fusões e aquisições dizem respeito à obtenção de novas plataformas tecnológicas para expansão nas áreas de negócios online.
Nesse contexto, chama a atenção o fato de convivermos até hoje, no Brasil, com a inexistência de um arcabouço jurídico sólido e claro sobre Direito Digital, além da quase inexistência de uma força policial especializada para garantir o desfrute seguro, por internautas e empresas online, do universo digital brasileiro.
Podemos dizer que a internet no País é um gigante que ainda engatinha na esfera legal e de segurança pública. Na esfera legal, não houve até o presente momento a normatização de quais seriam as condutas inaceitáveis na internet e das consequências para quem as cometer. Há exemplos gritantes.
Sabe-se que a lei não permite a invasão de um imóvel particular sem o consentimento do seu proprietário. A legislação brasileira, no entanto, não se atém à inconveniência de alguém acessar um computador pessoal de um terceiro sem a sua autorização.
Com relação à privacidade, tomemos o exemplo da ferramenta Google Street View, pela qual é possível ver as ruas de várias cidades no mundo - algumas capitais brasileiras incluídas. Muito criticada em seu início, especialmente na Europa, a versão brasileira mostra imagens que bloqueiam o rosto das pessoas e placas de carros. Em que pese essa elogiável atitude, merece destaque a completa alienação da legislação brasileira para a capacidade da internet de criar novas realidades sistematicamente.
Para investigar crimes que envolvam o uso de alta tecnologia diversos Estados brasileiros contam com delegacias especializadas, a exemplo da 4.ª Delegacia de Delitos Cometidos por Meios Eletrônicos, de São Paulo. Mas, apesar do esforço das autoridades de Segurança Pública e do Poder Judiciário, não há, no Brasil, política de segurança pública capaz de coibir eficazmente os delitos perpetrados via internet.
Outro problema importante diz respeito ao tempo de guarda dos dados de acesso (logs) dos internautas pelos provedores de acesso à internet. Hoje a legislação brasileira não dispõe sobre o prazo durante o qual o histórico de logs deve ser mantido. A última versão do Marco Regulatório da Internet - que, após uma saudável discussão pública envolvendo amplos segmentos da sociedade, está tramitando no Congresso Nacional com expectativa de ser aprovado ainda no primeiro semestre do próximo ano - prevê um tempo de guarda dos logs de seis meses, que, a nosso ver, seria um período adequado. Todavia, enquanto o marco regulatório não for promulgado em lei, não existe certeza de que os logs estarão disponíveis para investigações após tal período.
Nesse ínterim, tem ficado a cargo do setor privado brasileiro tomar as medidas necessárias para coibir os fraudadores contumazes, lançando mão de ferramentas de segurança, sistemas de informação, inteligência de crédito e de advogados especializados em Direito Digital. Sem isso a expansão do e-commerce no País se daria com uma vulnerabilidade capaz de minar sua confiabilidade, a ponto de minguá-lo.
Espera-se que, mesmo tardiamente, a adequação da legislação brasileira e as ações do poder público sejam efetivadas, impedindo grandes prejuízos ao pleno desenvolvimento deste importante instrumento de desenvolvimento econômico - e social, político e cultural - que é a internet.
MESTRE EM DIREITO COMERCIAL E INTERNACIONAL PELA UNIVERSIDADE DE VIRGÍNIA, É ESPECIALISTA
EM DIREITO DIGITAL
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