Não dá para sustentar
Celso Ming
O Estado de S. Paulo - 10/12/2010
Até mesmo o ministro Guido Mantega está vacilando entre a louvação e a advertência. Um crescimento econômico de mais de 8% em 2010, como está pintando, não é um fato a ser comemorado irrestritamente porque é também fonte de problemas. Para começar, a esse ritmo, este não é um crescimento sustentável. A contrapartida desse passo maior do que as pernas é o ressurgimento da inflação e perda da previsibilidade. Nem mesmo a desaceleração para alguma coisa em torno dos 5% nos próximos anos, que é a velocidade com que o governo pretende conduzir a economia em 2011, é algo com que se pode contar. Para crescer não a 8% ao ano como agora, mas apenas a 5%, como o pretendido, seria preciso investimentos da ordem de 25% a 26% do PIB. E, no entanto, neste ano, vamos tendo uma Formação Bruta de Capital Fixo (o termo que os economistas dão ao investimento nacional) de apenas 19,4% do PIB, embora este seja um número recorde. No ano passado, por exemplo, os investimentos totais não passaram de 17,9% do PIB. Não basta que os investimentos cresçam mais do que o consumo, como ontem tentou sofismar Mantega. Têm de crescer muito, muito mais do que o consumo para assegurar o ritmo desejado. Em segundo lugar, os números exuberantes do PIB ontem divulgados, "o maior crescimento mundial depois do da China", como chegou a gabar-se o ministro Mantega, não foram obtidos apenas com um forte avanço do crédito (de 20,3%, em 12 meses). Foram obtidos principalmente com a aplicação de uma boa dose de anabolizantes. As despesas públicas cresceram neste último ano cerca de 15,7%, portanto acima da arrecadação (que evoluiu a 10,9%), e criaram renda artificial, que, por sua vez, alimentou consumo e produção que não terão condições de se manter no mesmo nível. E é essa a razão pela qual o governo Dilma já anunciou que terá de apertar os cintos e de dar prioridade ao ajuste das contas públicas. Mais que tudo, o arranjo montado em 2010, que trouxe esse salto espantoso do PIB em tempos de forte crise mundial, atraiu de volta a inflação, deformação que não se pode tolerar, como ontem o presidente Lula avisou. Uma observação final. Nas duas últimas semanas, intensificaram-se as críticas à política monetária, que produz "juros escorchantes", e à política cambial, "que tira competitividade da empresa brasileira e produz desindustrialização", ambas de responsabilidade do Banco Central. Pois nem esses altos juros estão impedindo que a economia cresça a mais de 8% ao ano. E nem a forte valorização do real vêm impedindo que as exportações avancem a 10,8%, como ontem indicaram as Contas Nacionais. E tudo isso num ambiente de desemprego de apenas 6,1%, o mais baixo da série histórica do IBGE. Em todo o caso, no exterior ninguém vai notar que esse crescimento não poderá ser repetido. O desempenho da economia brasileira será comemorado porque, junto com o dos outros países emergentes, constitui no momento um dos poucos segmentos da economia global que continuam gerando demanda. As importações estão avançando a 39,8% ao ano e isso apresenta o Brasil para o mundo como um polo dinâmico. CONFIRA Austeridade de menos Desta vez, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, foi no ponto. "O descontrole dos gastos públicos deixa manco o tripé de políticas econômicas, composto também pelo sistema de metas de inflação e câmbio flutuante. Tal descompasso gera uma arquitetura econômica perniciosa de juros elevados e câmbio sobrevalorizado"", disse quarta-feira, logo depois que terminou a reunião do Copom. Discurso mudado É um ponto de vista diferente do externado em outras ocasiões, quando Skaf preferia dizer que o Banco Central estava errado ou que assumia uma atitude covarde demais na definição da política monetária. É a gastança Agora, o presidente da Fiesp reconhece que o problema é fiscal. É o governo gastando demais e deixando o Banco Central sozinho para contra-atacar a inflação. A conclusão é inevitável: quem quer juros baixos tem de trabalhar para apertar os cintos e isso reduz o campo para os negócios das empresas. |
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