terça-feira, junho 08, 2010

MERVAL PEREIRA

Baixarias 
Merval Pereira 

O Globo - 08/06/2010

A campanha presidencial brasileira está atingindo graus de baixeza política que se costuma criticar nas eleições americanas. Por lá, é habitual na época da eleição surgirem livros escandalosos com supostas revelações contra os candidatos, um hábito que os marqueteiros republicanos cultivaram e que acabou sendo usado também pelos democratas contra George W. Bush.

Mas o surgimento de dossiês com supostas acusações que derrubarão o candidato tal ou qual já está se tornando uma nociva tradição, graças ao PT.

Agora, sabe-se que a campanha da candidata oficial Dilma Rousseff tentou contratar ex-agentes de informação para montar dossiês contra o candidato do PSDB, José Serra, e parentes dele, além de grampos telefônicos, o que introduz na disputa eleitoral um tom acima de ilegalidade.

Junto a tudo isso, anunciase em press releases escandalosos distribuídos como propaganda política um livro de um jornalista investigativo que supostamente revelaria os bastidores das privatizações, com denúncias de corrupção.

Nas campanhas eleitorais americanas, episódios semelhantes já relatados aqui na coluna ficaram tristemente famosos, como o filmete de propaganda eleitoral dos veteranos de guerra do Vietnã acusando o candidato democrata de 2004 John Kerry de não merecer as medalhas e honrarias por bravura que recebeu.

Um livro foi publicado com o título de “Unfit for command” (“Despreparado para comandar”), tendo ido para a lista de best-sellers.

Outros candidatos a presidente também foram alvos de campanhas difamatórias, como o próprio George W.

Bush e Bill Clinton, mas os dois foram reeleitos.

Um dos livros mais violentos contra o expresidente Bush foi escrito por Molly Ivins, uma jornalista de esquerda do Texas, que, a começar pelo título, marcou o presidente com um apelido depreciativo: “Shrub”, o mesmo que “Bush” em inglês, uma espécie de arbusto.

O livro “Shrub: The short but happy political life of George W. Bush” (“A curta mas feliz vida política de George W. Bush”) faz acusações pesadas sobre negociatas e acordos políticos.

A relação passada de Barack Obama com o ex-pastor radical reverendo Jeremiah Wright, ou com William Ayers, professor de Chicago que participou de um grupo terrorista nos anos 60 do século passado, foram assuntos do livro “Um caso contra Barack Obama, a improvável ascensão e a não examinada agenda do candidato favorito da mídia”, de David Freddoso, um jornalista de direita da “National Review”, lançado em plena campanha de 2008.

Aqui no Brasil, o PT estaria inaugurando uma nova estratégia eleitoral ao abrigar no comitê eleitoral de sua candidata o jornalista que lançará seu livro em plena campanha, com acusações contra Serra.

As explicações dadas até agora pela direção do PT sobre a participação do comitê eleitoral na produção de dossiês contra o candidato tucano não passam de tentativas vãs de escapar da acusação central: por que o jornalista Luiz Lanzetta, principal responsável pela montagem da assessoria de imprensa do comitê eleitoral da candidata oficial, reuniriase com dois ex-agentes de órgãos de informação? Se foi ele quem convidou os arapongas, ou se foi contatado por eles, não faz a menor diferença.

O fato concreto é que quem não está interessado em dossiês e grampos telefônicos não marca reunião com conhecidos personagens que atuam na clandestinidade do sistema de informações.

Da mesma maneira, não se justifica a indignação de Dilma Rousseff por ter sido apontada por José Serra como responsável pelo dossiê, e muito menos o processo do PT contra o candidato tucano.

Se Lanzetta trabalhava no comitê eleitoral de Dilma, sendo um dos principais responsáveis pelo esquema de comunicação da campanha, qualquer decisão que tomasse seria de responsabilidade final da candidata, mesmo que ela não soubesse de nada.

Esse vício petista de a principal figura política fugir da responsabilidade alegando desconhecimento vem de longe, a começar pelo escândalo do mensalão.

O presidente Lula se disse traído num primeiro momento, os principais líderes petistas choraram na tribuna da Câmara quando o marqueteiro Duda Mendonça confessou na CPI que recebera dinheiro ilegal no exterior pela campanha de Lula, mas pouco a pouco a versão oficial foi se modificando.

Lula, de não saber de nada, acabou sendo o primeiro a justificar o ocorrido, afirmando que se tratava de dinheiro de caixa dois, que seria muito comum nas campanhas eleitorais brasileiras.

Hoje, já disse várias vezes que o caso não aconteceu, ou que o que aconteceu foi uma trama tucana para pegar petistas em uma armadilha.

Até hoje o episódio dos “aloprados” petistas em São Paulo na eleição de 2006 para o governo estadual não foi esclarecido, apesar de toda a alardeada eficiência da Polícia Federal.

Assessores diretos do presidente Lula e do então candidato ao governo paulista pelo PT Aloizio Mercadante foram apanhados em flagrante com um monte de dinheiro para comprar um suposto dossiê contra o tucano José Serra, e ninguém sabia de nada, ninguém viu nada. E ninguém está preso.

Desta vez, a coisa se repete com requintes de ilegalidade, pois estavam tentando até mesmo grampear o candidato adversário, e ninguém também sabe de nada.

O responsável pela contratação de Lanzetta, o exprefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel, homem de confiança de Dilma, a quem conhece desde a luta armada contra a ditadura militar, não sabe de nada, mas está sendo afastado do comando da campanha, de onde o próprio Lanzetta já foi saído.

E a candidata fica indignada com a insinuação de que ela tem responsabilidade sobre o que ocorre em sua própria campanha eleitoral.

Durma-se com um barulho desses.

Um comentário:

Mario disse...

MERVAL, MEU QUERIDO, FALE SOBRE OS DOSSIÊS FEITOS NO MINISTÉRIOS DO SERRA/FHC. ONDE TRABALHARAM OS "MOÇINHOS" QUE AGORA DIZEM ISSO QUE VOCÊ E SEUS COLEGAS DA PIG AFIRMAM.