Dilma quer um xaveco, o voto de lista
Elio Gaspari
O Globo - 30/06/2010
Na sua entrevista ao programa “Roda Viva”, a candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, defendeu a convocação de uma constituinte exclusiva para discutir e votar projetos de reformas política e tributária. Acrescentou que gostaria de encaminhar essas reformas logo no início do seu eventual mandato.
No que se refere à reforma tributária, recusou qualquer compromisso de reduzir a carga que atualmente está em 32% do PIB. Ela propõe um remanejamento dos impostos que pode até dar certo.
Quanto à reforma política, foi precisa: defende o voto de lista e o financiamento público das campanhas. Por enquanto, mais nada.
Louvem-se a precisão e a sinceridade da candidata.
Desde já, fica todo mundo avisado de que, se esse projeto prevalecer, a eleição deste ano será a última na qual os brasileiros votarão nominalmente nos seus candidatos à Câmara dos Deputados e às Assembleias Legislativas. Pelo sistema atual, o cidadão indica seu preferido.
Às vezes ele é eleito, às vezes não. Quando um candidato não atinge o quociente de seu partido, seus votos são derramados noutro nome. Na última eleição, o paulista que votou em Delfim Netto elegeu Michel Temer. Talvez não fosse isso que quisesse, mas restou-lhe a certeza de que preferia Delfim e nele votou.
Pelo sistema de lista, os partidos arrolam os candidatos, determinando a ordem de precedência numa lista. O cidadão vota só na sigla.
Quem defende esse sistema argumenta que assim se fortalece o sistema partidário. É preciso muita imaginação para acreditar que, no PT presidido por José Genoino, comandado por José Dirceu e entesourado por Delúbio Soares, as cúpulas partidárias mereciam esse crédito. O PTB, por exemplo, é presidido pelo grão-serrista Roberto Jefferson.
O PT refluiu para a defesa da centralização das escolhas eleitorais depois que foi para o poder. Antes, realizava até prévias. Neste ano, Lula esmagou todas as tentativas de consulta às bases companheiras.
Na outra ponta, José Serra detonou em silêncio a proposta de prévias defendida por Aécio Neves. (Quem sabe, começou a se arrepender.) Duas propostas para a adoção do sistema de listas já foram derrotadas na Câmara. Isso não faz a menor diferença para o comissariado petista. Afinal, no rastro da maioria obtida numa eleição presidencial, aprovou-se até o Plano Collor.
Enquanto Dilma Rousseff e o PT querem fechar o sistema eleitoral, na democracia mais vigorosa do mundo assiste-se a uma revolta popular contra as caciquias dos dois partidos. Se os marqueses do Democrata tivessem o poder que lhes era dado há 30 anos, Hillary Clinton estaria na Casa Branca.
Uma miniconstituinte convocada em cima do desfecho semiplebiscitário da eleição presidencial não chega a ser um chavismo, mas será um xaveco que mudará, para pior, o formato das instituições políticas brasileiras. Pelo andar da carruagem, o resultado da próxima eleição presidencial poderá estimular um surto legiferante para otras cositas más. Ainda bem que Dilma Rousseff está expondo, desde logo, sua plataforma básica.
Em tempo: José Serra nunca condenou ou defendeu o voto de lista, pois o xaveco tem boas simpatias no tucanato.
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