Vamos fiscalizar
MOZART VALADARES PIRES
O GLOBO - 25/05/10
Já se vão vinte e cinco anos desde que a população brasileira jogou a última pá de cal sobre o túmulo da ditadura militar. Da luta pelas Diretas e Constituinte aos dias de hoje vamos moldando, paulatinamente, a democracia almejada.
Não é um processo fácil. E a campanha pela aprovação do projeto de lei Ficha Limpa é um exemplo das dificuldades que a sociedade enfrenta.
A Associação dos Magistrados Brasileiros lançou, em 2006, as campanhas Contra a Corrupção e pela Ética na Política e Eleições Limpas, ambas de caráter permanente. E, em 2008, disponibilizou em seu site a lista dos candidatos a prefeito e vice-prefeito que respondiam a processos.
Ainda em 2008, a AMB propôs ao Supremo Tribunal Federal a reinterpretação da legislação eleitoral, por meio de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), a fim de tornar autoaplicável o § 9o, art. 14 da Constituição. Esse parágrafo afirma que a vida pregressa do candidato tem que ser considerada fator de inelegibilidade para proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício do mandato. O preceito está lá, mas nunca foi cumprido porque o Congresso não aprovou uma lei complementar regulamentando sua aplicação.
No entendimento da AMB, a reinterpretação permitiria ao juiz eleitoral impugnar candidatos réus em processos por improbidade administrativa ou criminal.
Seria um avanço, mas prevaleceu no Supremo o entendimento de que aos candidatos cujos processos não haviam transitado em julgado — ou seja, confirmado em última instância, sem possibilidade de novos recursos — caberia sempre a presunção de inocência. O que é um equívoco, pois na Justiça eleitoral o preceito que deve prevalecer é o da conduta ilibada.
Isso porque o voto é um cheque em branco que o eleitor passa ao político.
E ninguém é obrigado a assumir esse risco frente a alguém que já deu sinais de desonestidades. Esse ponto de vista, originado na ação da AMB, foi confirmado com a aprovação da lei Ficha Limpa.
As ações da AMB foram executadas concomitantes às promovidas pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), do qual faz parte junto com outras mais de 40 entidades. Seriam inócuas se não fossem precedidas pelo anseio da população em mudar a situação do país, tomado por ondas frequentes de denúncias de corrupção.
Cabe agora ao presidente da República a sanção rápida da lei para que ela possa vigorar ainda este ano. Efetivado este primeiro passo, a sociedade e suas entidades organizadas, entre elas a AMB, estarão em campo para garantir o cumprimento do texto aprovado.
MOZART VALADARES PIRES é presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros
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