3 x "Peixe Vivo"
Ruy Castro |
Folha de S. Paulo - 23/04/2010 |
RIO DE JANEIRO - E assim se passaram 50 anos, sem a pompa que se poderia supor. Os jornais, rádios e TVs soltaram seus cadernos, programas e especiais sobre o 50º aniversário de Brasília, mas a sombra que cobriu a cidade nesse período -palco de uma ditadura por 21 anos, viveiro de desqualificados políticos profissionais e cenário de negociatas literalmente incontáveis- ofuscou a celebração. O próprio Juscelino foi menos louvado do que ele próprio, apaixonado por sua aventura, esperaria ser. Um de seus argumentos para Brasília é que, com a capital no Rio, não tinha sossego para trabalhar -e, de fato, com o Catete cercado pela cidade, era difícil não sentir a presença da oposição. O nome disso é democracia, o que não impediu o democrata Juscelino de levar seu palácio para o meio do nada. Pois esse nada favoreceu o golpe que liquidaria sua carreira política. Brasília nunca lhe devolveu o que ele investiu nela em tempo, prestígio e poder. Para um presidente que, com razão, não queria reduzir-se a prefeito do Rio, ele acabou se rebaixando a mestre de obras de Brasília. E um mestre de obras relapso, que não via os caminhões de cimento e areia passando três vezes pela mesma guarita para registrar três entregas. Ficou o mito do homem risonho e pé de valsa, cuja canção favorita era o "Peixe Vivo". Mas este é apenas mais um mito. Há relatos de que, pelo ritmo das obras em Brasília, em poucos meses Juscelino já não suportava esta música. Em toda inauguração a que ele ia, a banda, depois de tocar o protocolar Hino Nacional, atacava de "Peixe Vivo" -e ponha aí três ou quatro inaugurações por dia, 300 dias por ano, durante quatro anos. O presidente dito "bossa nova" ficaria mais feliz se, às vezes, tocassem outra de suas preferidas: a seresta "Chão de Estrelas". |
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