Vacilação europeia
O Estado de S. Paulo - 09/04/2010 |
O presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, tentou ontem injetar mais uma dose de confiança no futuro da Grécia. Mas não obteve lá muito sucesso. Ele aproveitou a entrevista coletiva que normalmente dá após cada reunião do comitê de juros para dizer que "a quebra (default) da Grécia está fora de cogitação". Mas nem Trichet nem nenhum dirigente europeu conseguem reduzir a aflição geral, porque não respondem a questões básicas. Nessas condições, o mundo financeiro se comporta como se o calote fosse a hipótese mais provável. Ontem, por exemplo, foi o quinto dia consecutivo de aumento do rendimento (yield) exigido para ficar com títulos da dívida grega. Esse prêmio chegou ontem, nos títulos de 10 anos, a nada menos que 2 pontos porcentuais ao ano acima do que a Alemanha paga por sua dívida. É o mais alto desde 1999. E a Grécia precisa levantar empréstimos de US$ 15,4 bilhões até maio e US$ 24 bilhões até o final do ano. A insegurança tem muito a ver com a falta de definição com que as autoridades da área do euro, inclusive Trichet, vêm lidando com o problema. Por enquanto, a ajuda não passou de retórica. Os compromissos limitaram-se a garantir que não faltará socorro caso a Grécia não consiga levantar os empréstimos que precisa no mercado. Ainda assim, a salvação virá acoplada à consultoria e fiscalização do Fundo Monetário Internacional (FMI) que, ao longo dos trâmites, as autoridades descartavam por indesejável. A decisão dos dirigentes europeus foi, assim, empurrar a Grécia para o colo dos banqueiros, entendendo que bastaria a palavra empenhada de que não haverá a suspensão dos pagamentos por Atenas. Antes que isso acontecesse, o Olimpo europeu de Bruxelas e Frankfurt interviria. Agora se viu que dinheiro não é propriamente o problema. Os bancos sempre estarão dispostos a refinanciar dívida antiga ou a emprestar dinheiro novo para a Grécia. O problema é que um pormenor indevidamente desconsiderado faz toda a diferença. Os juros cobrados aos gregos estão cada vez mais esticados e isso aumenta a dificuldade para honrar a dívida futura. O primeiro-ministro da Grécia, George Papandreou, tem se esforçado para demonstrar que seu plano é econômica e politicamente consistente. Mas anda dizendo que, a esses preços, a dívida se transforma em corda no pescoço. Ninguém sabe qual é o nível do prêmio da rolagem da dívida cobrado pelos banqueiros, que finalmente amolecerá o coração dos rígidos dirigentes europeus de maneira a reconhecerem que a solução de mercado deixe de ser aceitável. E ninguém sabe, também, a que juros os dirigentes europeus oferecerão ajuda à Grécia para que valha a pena forçar a falta de solução de mercado. Se tudo se limitasse ao problema da Grécia, não haveria tanta vacilação e apreensão. O fato é que há ainda os problemas dos Pigs (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha). E aí estão os candidatos à bola da vez tão logo o caso da Grécia se resolva, já que o mundo da alta renda vive agora uma crise fiscal de amplas proporções. Para o País, esse drama vem com sinal ambivalente. De um lado, é um termo de comparação para uma avaliação mais adequada do bom momento da economia brasileira. De outro, traz impacto negativo, à medida que, apesar do grau de investimento, os títulos de dívida do Brasil ainda são avaliados com boa dose de risco. CONFIRA Sob fogo cerrado Três itens do custo de vida (IPCA) indicam forte componente de inflação de demanda: artigos de residência (avanço de 1%), vestuário (0,66%) e despesas pessoais (0,77%). Reforçam o argumento do Banco Central de que será necessário aumento dos juros. E o pacote das exportações? Mesmo que o governo edite um pacote de apoio às exportações, parece inevitável que ele seja insuficiente. Não há recursos para um superpacote. E isso implica que o governo escolha os setores a serem beneficiados. Qual será o critério? |
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