Você sabia que o que passa por sua cabeça tem poder de por em movimento ações concretas? Calma! Não vou falar de pensamento positivo, nem de autoajuda. Vou falar um pouquinho sobre a psicologia das expectativas.
Na psicanálise, dizemos que a realidade psíquica - que é a nossa representação subjetiva da realidade externa (essa que todos compartilhamos, até certo ponto, pelo menos) - é tão poderosa para gerar pensamentos, sentimentos e comportamentos quanto os fatos reais.
Por exemplo, você começa a achar que sua mulher arrumou outro e, para revidar, você vai olhando cada vez mais comprido para a vizinha, até que o inevitável acontece. Mas na verdade ela só tem trabalhado demais. Só que aí, do seu lado, já foi... Ou você acredita que aquelas ações que estão caindo vão sofrer uma reviravolta espetacular, embora seu consultor e outros especialistas já lhe tenham apontado que isso é mais improvável do que o mundo efetivamente cortar emissões de carbono depois da próxima reunião em Copenhague. A apesar disso, você se apega a elas e a esta expectativa um tanto irreal a ponto de perder bastante dinheiro logo à frente.
Em outras palavras, expectativas, que tem a ver com (auto)sugestão, podem criar uma outra realidade, funcionar como profecias autorrealizadoras, ter influência direta sobre desempenho e até alterar processos fisiológicos. Não está muito convencido? Quer exemplos?
Aqui vão estudos feitos por psicólogos econômicos e economistas comportamentais. O livro de Dan Ariely ("Previsivelmente Irracional") é recheado deles, mas um favorito é aquele experimento que envolve um certo sadismo: os sujeitos recebem choques elétricos e depois relatam a intensidade da dor sofrida. Em seguida, tomam uma aspirina, esperam, recebem novos choques e, ao final, descrevem novamente o nível de dor.
O objetivo aparente seria avaliar o grau de alívio obtido com o medicamento, mas na verdade foi feito o seguinte: o contexto para um dos grupos de sujeitos foi todo positivo - lugar bacana, médica e demonstradora bem-apessoadas, propagandas elogiosas ao remédio etc. - e o preço da aspirina mais alto do que de costume. No outro grupo, tudo mais modesto e o preço da aspirina agora raspado, como se estivesse em promoção, por uma fração do valor original.
Será que esses detalhes - irrelevantes para reduzir ou aumentar a dor, certo? - mudaram alguma coisa na experiência das pessoas? Sim! Quem tomou aspirina cara achou que a segunda sessão de choques não foi tão ruim, ao passo que os que tomaram a aspirina supostamente em promoção não sentiram grande diferença entre as duas sessões. O ambiente elegante e o remédio caro fizeram o primeiro grupo acreditar mais em seu efeito. Ou seja, foram as expectativas, embora, em nenhum caso, fosse aspirina: era vitamina C!
Mas veja também estes outros estudos americanos, que testaram o quanto vestimos a carapuça de estereótipos que podem estar associados à nossa imagem, isto é, como respondemos ao que acreditamos que se espera de nós (Shi, Pittinsky, & Ambady, Psychological Science, 1999). Universitárias de origem asiática tinham que fazer um teste de matemática. Elas foram divididas em três grupos. Para o primeiro grupo, foi aplicado um questionário neutro. Para o segundo, havia perguntas que lembravam gênero. No terceiro, perguntas que lembravam a origem familiar.
Depois de responder às questões, faziam o teste. O fato de ser mulher afeta a capacidade matemática? Pode ser, uma vez que não se espera facilidade nessa área para mulheres, independentemente de sua real capacidade. No teste, o desempenho do primeiro grupo (neutro) ficou no meio; entre o grupo cujo questionário pensou em gênero, o pior. E o que fora relembrado da condição oriental, tradicionalmente bem-sucedidos em matemática, foi o melhor.
Mas devagar com o andor, rapazes: quando um experimento equivalente foi feito com homens e o teste avaliava desempenho verbal, os resultados se inverteram! Neste caso, são os homens que se sentem inseguros com relação à sua capacidade de expressão verbal e foram pior quando relembrados de sua condição masculina...
Expectativas tem um peso grande sobre o que fazemos. Por isso, se alguém lhe recomendar um investimento incrível, em especial se estiver investido daquela aura de autoridade que costuma inspirar confiança - ou vago temor... -, num local chic, e você ficar logo favoravelmente impressionado, lembre-se de também colher todas as informações consistentes sobre o negócio ou chame seu especialista de confiança para avaliá-lo antes de fechar, ok?
Vera Rita de Mello Ferreira é psicanalista, consultora, professora, representante no Brasil da International Association for Research in Economic Psychology (IAREP) e autora dos livros "Psicologia Econômica" e "Decisões econômicas - você já parou para pensar?" |
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