Brasil, EUA e percepções
FOLHA DE SÃO PAULO - 26/11/09
LISBOA - A entrevista de Marco Aurélio Garcia, em que fala da decepção com o governo Barack Obama, é forte, mas está longe de caracterizar um conflito, ao contrário do que parte da mídia deu a entender.
Parece muito mais um pedido de atenção, no trecho em que constata, com razão, o descuido de Obama para com a América Latina, no que, aliás, ecoa o que o chanceler Celso Amorim havia dito à Folha alguns dias atrás.
O pedido até funcionou: ontem o general James Jones, assessor de segurança nacional de Obama, telefonou para Marco Aurélio e tudo ficou claro: não há um estranhamento nas relações bilaterais, mas "percepções" diferentes sobre alguns temas, disse o assessor de Lula (detalhes no caderno Mundo).
O estado real das relações bilaterais, à margem de retóricas mais ou menos quentes, está na entrevista que Eliane Cantanhêde fez com Mauro Vieira, o novo embaixador em Washington e, como tal, a pessoa mais indicada para tomar a temperatura: "Os Estados Unidos, hoje, tomam o Brasil como um interlocutor importante, válido. Ouvem o Brasil não apenas para os temas bilaterais mas também regionais e multilaterais. A boa química entre os dois presidentes ajuda muito, e eles já se encontraram cinco vezes", disse Vieira.
O descuido de Obama pode ser explicado assim, na experiente voz de Mário Soares, ex-presidente e, hoje, o grande patriarca da política portuguesa: "Obama tem todo o peso do mundo em cima e não pode fazer tudo de uma vez".
Bingo. Obama está se engajando demais em diferentes regiões. A América Latina, por não ser um problema, não é uma prioridade.
Honduras, como é óbvio, não chega a ser um, digamos, Afeganistão para Obama. Mas, mal conduzida a questão, pode criar uma perturbação com o Brasil e com parte grande da América Latina.
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