terça-feira, novembro 10, 2009

LOUIS UCHITELLE

Em busca de um PIB verdadeiro

O Estado de S. Paulo - 10/11/2009


Uma lacuna cada vez maior entre dados estatísticos e a realidade está distorcendo a perspectiva que o governo tem da saúde da economia, superestimando o crescimento e a produtividade de maneiras que podem afetar o debate político sobre temas como comércio, salários e criação de empregos.

As falhas do sistema de recolhimento de dados foram evidenciadas na sexta feira e no sábado durante reunião de economistas do governo e da academia - a primeira do tipo - determinados a elaborar um panorama estatístico mais fiel.

O lapso fundamental está na forma de se contabilizar as importações: um carburador comprado da China por US$ 50 como componente de um carro fabricado nos Estados Unidos, por exemplo, aparece nas estatísticas como se fosse a versão americana da peça, avaliada em, digamos, US$ 100.

O fracasso em distinguir entre aquilo que é fabricado nos EUA e o que é feito no exterior infla de maneira ilusória o Produto Interno Bruto (PIB), medida que soma todo o valor agregado no país.

Os trabalhadores americanos perdem empregos quando um carburador antes fabricado por eles passa a ser importado. Dados do governo mostram o declínio nos postos de trabalho, mas não reavaliam o preço dos carburadores nem apontam o fato de serem eles fabricados no exterior.

"Não dispomos da estrutura de coleta de dados capaz de representar em tempo real o que está ocorrendo, nem de indicar aquilo que é comercializado, nem de avaliar o efeito que tem sobre os trabalhadores", disse Susan Houseman, economista sênior do Instituto W. E. Upjohn de Pesquisa sobre o Trabalho, autora de pesquisas pioneiras no ramo.

As distorções estatísticas podem ser significativas. Na pior das hipóteses, o crescimento do PIB teria sido de apenas 3,3% anuais no terceiro trimestre, em vez dos 3,5% relatados, de acordo com alguns especialistas presentes na conferência. A mesma lacuna pode ser observada na produtividade. E a disparidade aumenta conforme aumentam as importações.

As agências federais responsáveis por reunir as estatísticas do país reconhecem cada vez mais a falta dos dados necessários para calcular o impacto da importação de bens e serviços conforme saltam de insignificantes 5% de toda a atividade econômica há 35 anos para os mais de 12% atuais, excluído o petróleo. Como resultado, muitos artigos importados são contabilizados como se fossem americanos, e portanto mais caros do que seus correspondentes importados.

O problema é particularmente grave nas manufaturas. Componentes importados constituem parcela ainda maior dos computadores, automóveis, eletrodomésticos e outras mercadorias prontas que saem das linhas de montagem nos EUA - e uma parcela ainda maior de todas as importações do país.

Mas o sistema estatístico ainda não é capaz de distinguir entre os componentes fabricados nos EUA e aqueles fabricados no exterior, nem de avaliar seu impacto sobre o emprego. Como disse Lori G. Kletzer, economista da Universidade da Califórnia em Santa Cruz: "Não sabemos quais empregos foram transferidos para o exterior".

O mesmo vale para os serviços. Uma firma de contabilidade em Nova York que mantém 50 funcionários terceiriza algumas de suas funções para contadores mais baratos na Índia. Esse trabalho retorna a Nova York via transmissão eletrônica e é contabilizado pelos preços nova-iorquinos, como se fosse um valor agregado no país.

Enfrentando o desafio de lidar com estes pontos cegos, quase todos os 80 especialistas reunidos na conferência - patrocinada pelo Instituto Upjohn e pela Academia Nacional de Administração Pública - concordaram que as estatísticas tendem a exagerar na representação da força da economia.

O objetivo dos frequentadores da conferência é consertar o modelo estatístico, mas para tanto serão necessários muitos anos e muito dinheiro (do Congresso) para reunir mais informações sobre aquilo que as empresas estão fazendo, e procedimentos inteiramente novos para medir as importações.

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