terça-feira, novembro 10, 2009

AUGUSTO NUNES

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Anotações para uma reedição da história universal da infâmia

10 de novembro de 2009

Em novembro de 1984, por não enxergar diferenças entre Paulo Maluf e Tancredo Neves, o Partido dos Trabalhadores optou pela abstenção no Colégio Eleitoral que escolheria o primeiro presidente civil depois do ciclo dos generais. Em janeiro de 1985, por entenderem que não se tratava de um confronto entre iguais, três parlamentares do PT ─ Airton Soares, José Eudes e Bete Mendes ─ votaram em Tancredo. Foram expulsos pela direção.

Em 1988, num discurso em Aracaju, o deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva qualificou o presidente José Sarney de “o grande ladrão da Nova República”. No mesmo ano, a bancada do PT na Constituinte votou contra a aprovação da nova Constituição.

Em 1989, ambos derrotados no primeiro turno da eleição presidencial, Ulysses Guimarães, candidato do PMDB, e Mário Covas, do PSDB, declararam-se prontos para unir-se a Lula na batalha final contra Fernando Collor. O apoio foi recusado. Acabou aceito por insistência dos candidatos a aliado. Num comício em frente do estádio do Pacaembu, Ulysses, Covas e outros líderes dos dois partidos apareceram no palanque ao lado de Lula. Foram vaiados.

Em 1993, a ex-prefeita Luiza Erundina, uma das fundadoras do PT, aceitou o convite do presidente Itamar Franco para assumir o comando de um ministério. Foi expulsa. Em 1994, ainda durante o governo de Itamar Franco, os parlamentares do PT lutaram com ferocidade para impedir a aprovação do Plano Real. No mesmo ano, mesmo confrontados com o evidente sucesso da grande mudança na economia, transformaram a revogação do Plano Real numa das bandeiras da campanha presidencial.

Entre o começo de janeiro de 1995 e o fim de dezembro de 2002, a bancada do PT votou contra todos os projetos, medidas e ideias encaminhados ao Legislativo pelo governo Fernando Henrique Cardoso. Todos. Sem exceção. Uma das propostas mais intensamente combatidas foi a que instituiu a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Em janeiro de 1999, mal iniciado o segundo mandato de Fernando Henrique, o deputado Tarso Genro, em nome do PT, propôs a deposição do presidente reeleito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. O lançamento da campanha com o mote “Fora FHC!” foi justificado por acusações, desacompanhada de provas, que Tarso enfeixou num artigo publicado pela Folha de S. Paulo. Trecho: Hoje, acrescento que o presidente está pessoalmente responsabilizado por amparar um grupo fora da lei, que controla as finanças do Estado e subordina o trabalho e o capital do país ao enriquecimento ilegítimo de uns poucos. Alguns bancos lucraram em janeiro (evidentemente, por ter informações privilegiadas) US$ 1,3 bilhão, valor que não lucraram em todo o ano passado!

O que diriam Tarso, Lula e o resto da companheirada se tal acusação, perfeitamente aplicável ao atual chefe de governo, fosse formulada por alguém do PSDB, do DEM ou do PPS? Coisa de traidor da pátria, inimigo da nação, gente partidária do quanto pior, melhor, estariam berrando todos. “Tem gente que torce pra que tudo dê errado”, retomaria Lula a ladainha entoada há quase sete anos. Faz sentido. Desde a ressurreição da democracia brasileira, a ação do PT oposicionista foi permanentemente orientada por sentimentos menores, miúdos, mesquinhos. É compreensível que os Altos Companheiros acreditem que todos os políticos são movidos pelo mesmo combustível de baixíssima qualidade.

Desfigurado pela metamorfose nauseante, o agora chefe de governo não teria sossego se o intratável chefe da oposição virasse sobrevivido à virada do século. Sempre ao som dos balidos aprovadores, o antigo caçador de gatunos virou padroeiro da quadrilha federal, o brigão que recusou a conciliação proposta por Tancredo hoje se reconciliou com qualquer abjeção desfrutável, o moralizador da República presidiu o escândalo incomparável do mensalão. Mas não admite sequer criticas formuladas sem aspereza pelo antecessor que atacava com virulência.

É inveja, Lula deu de gritar agora. O espelho reflete o contrário. Nenhum homem culto prefere ser ignorante, nenhum homem educado sonha com a grosseria, gente honrada não quer conversa com delinquentes. Lula foi derrotado por FHC duas vezes, ambas no primeiro turno. Ele sabe que o vencedor nunca inveja o vencido.

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