Pacientes conveniados se utilizam do atendimento SUS, que acaba subsidiando o tratamento para outras fontes pagadoras
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A INFLAÇÃO na área de saúde cresce mais depressa que o produto interno bruto mundial. Os Estados Unidos, campeão de gastos nesse campo, gastam mais de 16% de seu PIB com saúde -e esse percentual não para de crescer. As autoridades têm demonstrado dificuldade para se adaptarem às demandas de saúde em um mundo mais rico, mais saudável e, principalmente, mais velho. O atendimento universal ainda é um desafio, e a incorporação de novos tratamentos cada vez mais sofisticados representa um problema adicional. Eles oferecem benefícios cada vez mais específicos a custos crescentes, difíceis de conciliar com uma política de acesso universal. No Brasil, ainda temos iniquidades bastante significativas, mas iniciativas pontuais vêm mostrando resultados positivos. É o caso do Estado de São Paulo, que, há mais de uma década, optou pelo modelo de organização social de saúde (OSS) na administração hospitalar. Baseado em uma parceria entre governo e entidades com experiência no atendimento médico, o modelo vigora hoje em 17 ambulatórios médicos especializados (AMEs) e em 32 hospitais paulistas, demonstrando vantagens em relação ao modelo de administração direta, com maior flexibilidade no uso do orçamento e na contratação e dispensa de funcionários. O estabelecimento de um contrato de gestão com a definição de metas assistenciais e a existência de um sistema de avaliação periódica resultam em transparência no investimento realizado pelo poder público. Esta agilidade será fundamental para o tratamento efetivo do câncer, doença que mais cresce entre populações de países desenvolvidos e em desenvolvimento. Em algumas nações, já em 2020, o câncer deve ser a principal causa de morte -e o Brasil segue o mesmo caminho. Para enfrentar essa realidade, surgiu o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira. Gerido pela Fundação Faculdade de Medicina, hoje o Icesp atende cerca de 6.000 pacientes e está totalmente incorporado ao complexo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Ainda existem desafios a transpor, mas o Icesp já rivaliza em tamanho com grandes centros mundiais de câncer. Por conta da excelência demonstrada ao longo do primeiro ano de funcionamento, a procura por tratamento no instituto é crescente, inclusive por parte de pessoas que dispõem de seguro-saúde ou de recursos próprios para custear seu tratamento. Tramita hoje na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo um projeto de lei complementar que propõe, entre outras modificações, o fim da obrigação das organizações sociais de saúde de destinar 100% de seu atendimento ao SUS. A mudança, claro, não deve implicar diferenças no tratamento ou mesmo redução do atendimento SUS em prol do atendimento privado. Ao contrário. Se for aprovada, deve viabilizar a ampliação da assistência. Pacientes conveniados já se utilizam dos serviços dessas instituições, mas, se esse mesmo serviço fosse prestado em outro hospital, seria pago pela seguradora. Da forma colocada atualmente, o SUS acaba subsidiando o tratamento para outras fontes pagadoras, ou seja, um Robin Hood às avessas. No Instituto do Coração (InCor), por exemplo, 21% dos pacientes tratados em 2008 tinham convênio, mas foram responsáveis por 51% de toda a receita assistencial. O restante das vagas -79%- foi destinado a pacientes atendidos pelo sistema público. O aporte financeiro que entraria no orçamento das OSSs via seguradoras ou via recursos privados poderia ser usado para ampliar o atendimento a pacientes SUS. A experiência de uma década com o modelo de administração hospitalar por organizações sociais de saúde mostra que é necessário modernizar a lei, permitindo que fontes adicionais de recursos já disponíveis possam ser utilizadas. Dessa forma, será possível garantir e até ampliar a assistência a quem realmente não dispõe de recursos para custeá-la.
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