quarta-feira, setembro 30, 2009

CELSO MING

Felicidade Interna Bruta


O Estado de S. Paulo - 30/09/2009
O presidente da França, Nicolas Sarkozy, está defendendo a adoção de um novo padrão para medir o desempenho da economia. Em vez de comparar tudo com o Produto Interno Bruto (PIB), que corresponde à renda nacional, quer que prevaleça o conceito de Felicidade Interna Bruta (FIB).

A ideia é incorporar aos padrões produtivos valores de vida, como tempo de lazer, qualidade ambiental, desfrute de valores culturais, transporte confortável e aposentadoria saudável.

Conceituar e medir tudo isso não é fácil porque pressupõe a adoção de valores nem sempre aceitos universalmente, como liberdade, harmonia com a natureza, respeito às ideias e à religião dos outros e coisas assim.

O primeiro a sugerir o conceito de FIB, em 1972, foi Jigme Singye Wangchuck (veja foto), então rei do Butão, território incrustado na longínqua cordilheira do Himalaia, com 600 mil habitantes, o equivalente à cidade paulista de São José dos Campos.

Para o rei Jigme, hoje com 53 anos, o país não deve apenas perseguir prosperidade. Essa prosperidade, dizia, tem de ser partilhada, tem de considerar a preservação das tradições do povo, que deverá contar com um governo justo, moderno e responsivo.

É uma atitude que tem a ver com as tradições budistas que encontraram repercussão nos ocidentais cansados de correr atrás de riquezas vazias. Em 2006, o rei Jigme abdicou em nome de seu filho, hoje com 29 anos.

Embora o Butão continue apresentando uma das rendas per capita mais baixas do Planeta, de US$ 1,9 mil, a expectativa de vida entre 1984 e 2005 cresceu de 47 para 66 anos, o que não deixa de ser um indicador de melhora da qualidade de vida.

De 1972 para cá, antropólogos, sociólogos, religiosos, filósofos, políticos e economistas têm debatido a aplicação do princípio, formas de medi-lo e que peso dar a cada item. Aparentemente, os resultados não são grande coisa. Sem ter conhecido a proposta do rei Jigme, o economista britânico E. F. Schumacher sugeriu algo nessa linha no livro Small is Beautiful, contra o agigantamento das corporações ocidentais.

Na edição de ontem, o Wall Street Journal sugeriu que a proposta de Sarkozy tem a ver com o fato de que a França ficou para trás no processo de crescimento econômico e que agora tenta compensar o baixo desempenho com valores supostamente mais importantes - como o coelho deve ter dito à tartaruga na competição entre a bicharada: "Cheguei depois, mas cheguei descansado e, portanto, mais feliz."

Os franceses parecem apostar na ideia de que trabalhar menos é indício de felicidade e talvez por isso venham tentando implantar a jornada de 35 horas semanais. O Wall Street lembra que o economista Edward Prescott já se perguntou "por que os americanos trabalham mais do que os europeus", e a resposta foi que os europeus estão pendurados nas vantagens garantidas pelo Estado do bem-estar social. É o sistema que dá a sensação de que não vale a pena trabalhar mais, pois o governo leva quase tudo em impostos. Mas a crítica tem um ranço ideológico. Baseia-se na ideia de que o sistema neoliberal é melhor do que a social-democracia.

O fato é que não faz sentido defender a economia e a política de crescimento econômico se o aumento de riqueza não puder ser partilhado e desfrutado pela população.



CONFIRA
Aumentando - O crédito continua crescendo. Em agosto do ano passado correspondia a 37,6% do PIB. No mesmo mês deste ano já atingia 45,2% do PIB. (O PIB do Brasil em agosto era de R$ 2,93 trilhões).


Um dos principais problemas da atual crise global foi o estancamento do crédito. Mas, aqui no Brasil, isso não aconteceu. Desde dezembro de 2007, o crédito vem aumentando todos os meses.


De agosto a agosto, a Selic caiu de 13,00% para 8,75% ao ano, o que dá uma queda de 32,7%. No entanto, a redução dos juros na ponta do crédito é insignificante.

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