Visão militar
O Globo - 06/08/2009 |
Hoje o Brasil tem 53 militares, de patentes diferenciadas, treinando em escolas americanas como West Point. Há uma longa tradição de cooperação. Ainda que mantendo-se a necessária distância. Visitas militares americanas, inclusive de oficiais de alta patente, têm sido mais frequentes. — A gente sente que eles querem agradar, mas são meio atrapalhados. Não vejo qualquer ameaça militar americana ao Brasil nem direta, nem indireta — disse. Há pouco mais de um mês houve uma competição das forças especiais de 21 países latino-americanos. É uma competição tradicional, sempre organizada, financiada e arbitrada pelos Estados Unidos. É uma espécie de competição de esportes radicais. O ganhador é sempre a Colômbia cujo Exército é treinado pelos americanos. Desta vez, foi um pouco diferente. Nossas Forças Armadas disseram que como era em solo brasileiro, a competição seria organizada e arbitrada por brasileiros. Aceitaram apenas o financiamento americano. Quem ganhou foi o Brasil. O segundo lugar, surpreendentemente, foi do Equador, e a Colômbia veio em terceiro. Ou seja, há espaço para visitas, intercâmbio e até olimpíadas militares entre os países da região. Nada lembra um clima belicoso. Para o general, o mal-estar agora foi causado por uma incapacidade americana de entender quais são os sentimentos e reações dos países latino-americanos em relação a eles. Até por confusões históricas, o governo americano deveria ter consultado os países da região. Na visão do general, a tensão é causada mais por Hugo Chávez e ela pode vir a ser uma ameaça para o Brasil mais adiante. — Ele hoje já controla o governo dele, da Bolívia, do Equador, tem influência na Argentina e Paraguai. No Peru, onde seu candidato Ollanta Humala perdeu no photochart, o presidente Alan Garcia está com baixíssima popularidade. Chávez jogará todo o dinheiro possível para controlar o governo de Lima. Quando acontecer isso ele completa seu arco bolivariano. Enquanto o governo brasileiro fizer tudo o que ele quer, fica tudo bem. Mas no futuro pode haver tensão entre nós. Eles têm força econômica, saída para o Pacífico, Atlântico, Caribe e um governo que gosta de confrontos. Nosso problema não é militar com os Estados Unidos, é de geopolítica da região — disse o general. Para o militar, não há qualquer ameaça dos americanos sobre o território brasileiro. Na avaliação que faz, os americanos perderam a base de Manta no Equador, perderam a presença na Bolívia, onde a DEA (departamento de combate às drogas) trabalhava livremente. Além disso, não têm tido tanto sucesso assim na Colômbia: — As Farc estão mais enfraquecidas, mas o tráfico não teve queda sensível. Os americanos já estão na Colômbia há muito tempo e todo mundo sabe. Ontem, Hugo Chávez escalou e falou que as bases americanas na Colômbia podem detonar uma guerra na América do Sul. É claro, pura retórica. Ele gosta de manter esse clima de beligerância no qual cresce, aparece, e foge do desgaste provocado pelas crises política e econômica. Nesta situação, cabe ao Brasil manter seu tradicional equilíbrio com o qual vem se mantendo em paz por mais de um século com os países do continente. O que deveria ser evitado é tomar satisfação da Colômbia e ser condescendente com a Venezuela. É achar normal que a Venezuela faça exercícios com a esquadra russa, mas tratar o acordo militar dos Estados Unidos com a Colômbia como um risco iminente de invasão do território brasileiro. Quando veio a esquadra russa, circularam rumores de que o presidente Lula não gostou, mas oficialmente o Brasil não disse que os russos aqui, em águas venezuelanas, lembravam a guerra fria. Hugo Chávez criticou quem pensasse nisso. “Este é um velho plano. Trataram de especular que é a nova Guerra Fria, toda uma manipulação, isso não é nenhuma provocação, é um intercâmbio entre dois países livres e soberanos”, disse Chávez na noite da chegada dos navios russos. No fim, os dois países assinaram um acordo para a construção de uma usina nuclear na Venezuela. O semi-ministro das relações exteriores do Brasil, Marco Aurélio Garcia, disse sobre as bases americanas na Colômbia que cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça. A expressão é engraçada, mas não traduz o clima no país, nem nas relações com os Estados Unidos. O Brasil não é uma republiqueta ameaçada, é um país soberano, que saberá manter essa posição. Não precisa tremer diante de qualquer coisa, nem deixar que o rabo balance o cachorro, como, por exemplo, aceitando que Chávez dê o tom da nossa atitude diplomática, na relação com o nosso maior parceiro comercial e país do qual recebemos o maior volume de investimentos. |
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