FOLHA DE SÃO PAULO - 14/06/09
A viagem que decidimos fazer tem que ser aquela, naquele dia, naquela hora, parece até que estamos num quartel |
EM JANEIRO deste ano escrevi uma carta para dona Solange, da Anac, falando mal das regras das companhias aéreas, mas nada mudou: está tudo exatamente igual - para nós, passageiros. Vou lembrar dos tempos antigos que talvez dona Solange não tenha conhecido por ser muito novinha.
Era assim: comprava-se uma passagem Rio-São Paulo e embarcava-se no primeiro avião que saía, fosse ele de qualquer companhia (e todas as passagens custavam o mesmo preço). Ora, quem vai a São Paulo, na maioria das vezes, é para almoçar, ter uma reunião, no máximo dormir e voltar no dia seguinte cedo.
Mas o passageiro é obrigado, ao comprar a passagem ida e volta, a marcar a hora da volta, o que em caso de férias grandes é normal, mas numa curta viagem de negócios é impossível, pois reuniões podem atrasar ou serem desmarcadas, e, se deixar para comprar a passagem na hora, vai pagar um preço muito mais alto do que se comprasse com antecedência.
Porque não se pode comprar a passagem com a volta em aberto, para marcar na hora mais conveniente? Poder pode, mas custa muito mais caro, e não me pergunte por que, pergunte à dona Solange e ao ministro Nelson Jobim.
Aliás, dona Solange, a próxima vez que descer no Santos Dumont, se ainda for dia claro, ponha um olho naqueles canteiros no meio das pistas; cresceu ali um mato que não custaria nada descolar alguém para cortar. A cada vez que meu avião desce, morro de medo de ver sair dali uma cobra ou uma onça, e não diga que não avisei.
As novas leis nacionais e internacionais da aviação, que nos impedem de trocar a data da viagem, mesmo antes de fazer o primeiro trecho, sem pagar uma taxa, está fazendo algo de pior, bem pior do que tomar mais um pouco do nosso dinheiro.
Estão nos tirando a liberdade de mudar de ideia, e se estiver de passagem marcada para Amsterdã e por um bom motivo (ou sem motivo nenhum) resolver jogar tudo para o alto e ir para a Grécia, vai passar o dia inteiro tentando, pelo telefone, mudar o itinerário - fora o que vai ter que pagar - ou, como eles aconselham, entrar na internet, e modificar todo seu plano de viagem.
Eu, que não sei fazer isso, perco um dia inteiro no telefone, enquanto o robô me diz "se quiser falar em português digite um; em inglês, digite dois", e por aí vai, quando tudo que quero é uma voz humana, santa ingenuidade.
A viagem que decidimos fazer tem que ser aquela, naquele dia, naquela hora, para aquele destino, parece até que estamos num quartel.
E o inesperado? E a indecisão? E o imprevisto, que quer nos levar para um lado que parece ser maravilhoso, mas para o qual não podemos ir porque as companhias não deixam; aliás, até deixam, mas com tanta dificuldade que até perde a graça.
Estão nos tirando a liberdade de mudar de ideia, de mudar de vida, de embarcar numa aventura sem saber como vai terminar, mas que, enquanto durar, vai ser fascinante, dê no que der. É essa liberdade que se procura quando se planeja uma viagem, e é a ideia de que tudo pode acontecer que faz de qualquer viagem algo de tão romântico.
E é isso que nos estão roubando, com essas regras de quartel, só que são poucos os que têm vocação para soldado. E para eles não faz diferença, porque militares não costumam sonhar.
Era assim: comprava-se uma passagem Rio-São Paulo e embarcava-se no primeiro avião que saía, fosse ele de qualquer companhia (e todas as passagens custavam o mesmo preço). Ora, quem vai a São Paulo, na maioria das vezes, é para almoçar, ter uma reunião, no máximo dormir e voltar no dia seguinte cedo.
Mas o passageiro é obrigado, ao comprar a passagem ida e volta, a marcar a hora da volta, o que em caso de férias grandes é normal, mas numa curta viagem de negócios é impossível, pois reuniões podem atrasar ou serem desmarcadas, e, se deixar para comprar a passagem na hora, vai pagar um preço muito mais alto do que se comprasse com antecedência.
Porque não se pode comprar a passagem com a volta em aberto, para marcar na hora mais conveniente? Poder pode, mas custa muito mais caro, e não me pergunte por que, pergunte à dona Solange e ao ministro Nelson Jobim.
Aliás, dona Solange, a próxima vez que descer no Santos Dumont, se ainda for dia claro, ponha um olho naqueles canteiros no meio das pistas; cresceu ali um mato que não custaria nada descolar alguém para cortar. A cada vez que meu avião desce, morro de medo de ver sair dali uma cobra ou uma onça, e não diga que não avisei.
As novas leis nacionais e internacionais da aviação, que nos impedem de trocar a data da viagem, mesmo antes de fazer o primeiro trecho, sem pagar uma taxa, está fazendo algo de pior, bem pior do que tomar mais um pouco do nosso dinheiro.
Estão nos tirando a liberdade de mudar de ideia, e se estiver de passagem marcada para Amsterdã e por um bom motivo (ou sem motivo nenhum) resolver jogar tudo para o alto e ir para a Grécia, vai passar o dia inteiro tentando, pelo telefone, mudar o itinerário - fora o que vai ter que pagar - ou, como eles aconselham, entrar na internet, e modificar todo seu plano de viagem.
Eu, que não sei fazer isso, perco um dia inteiro no telefone, enquanto o robô me diz "se quiser falar em português digite um; em inglês, digite dois", e por aí vai, quando tudo que quero é uma voz humana, santa ingenuidade.
A viagem que decidimos fazer tem que ser aquela, naquele dia, naquela hora, para aquele destino, parece até que estamos num quartel.
E o inesperado? E a indecisão? E o imprevisto, que quer nos levar para um lado que parece ser maravilhoso, mas para o qual não podemos ir porque as companhias não deixam; aliás, até deixam, mas com tanta dificuldade que até perde a graça.
Estão nos tirando a liberdade de mudar de ideia, de mudar de vida, de embarcar numa aventura sem saber como vai terminar, mas que, enquanto durar, vai ser fascinante, dê no que der. É essa liberdade que se procura quando se planeja uma viagem, e é a ideia de que tudo pode acontecer que faz de qualquer viagem algo de tão romântico.
E é isso que nos estão roubando, com essas regras de quartel, só que são poucos os que têm vocação para soldado. E para eles não faz diferença, porque militares não costumam sonhar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário