A construção de muros em favelas do Rio tem adversários e defensores no Rio, dentro e fora das comunidades. Mas é difícil negar que o projeto, patrocinado pelo governo estadual e a prefeitura, pode ter - se for cumprido direitinho, evidentemente - duas virtudes: conter o crescimento das favelas, protegendo as áreas verdes da cidade, e reduzir a mobilidade das quadrilhas de traficantes.
Na Rua Álvaro Ramos, em Botafogo, já há muros cercando o conjunto Pio XII, e seus moradores só têm uma reivindicação: que sejam mais altos, para protegê-los dos bandidos. Na Rocinha, o governo estadual anuncia investimentos de R$21 milhões, dos quais R$2,5 milhões serão usados num muro. E muitos favelados locais parecem gostar da ideia.
Mas, fora do Brasil, só se ouvem críticas enfáticas. Segundo o "Times", de Londres, os muros transformarão as favelas em guetos. É uma opinião curiosa: parte do princípio que favelas não muradas não são guetos.
Esta semana, em Genebra, a ONU promoveu uma espécie de sabatina do governo Lula, e o pau comeu solto. Técnicos da organização criticaram a corrupção no Brasil, definido como "país da impunidade", e condenaram a falta de acesso da população à Justiça. Até aí, não se pode realmente dizer que o pessoal esteja mal-informado.
Mas um perito, Álvaro Tirado Meijin, parece ter sido o crítico mais enfático, e seu tema principal foi exatamente a construção de muros nas favelas. O principal representante brasileiro, Paulo Vannuchi, ministro de Direitos Humanos, estava preparado para reconhecer problemas históricos - como o genocídio de indígenas e os excessos da ditadura militar - mas deixou claro que sabia muito pouco sobre favelados, traficantes e muros no Rio de Janeiro.
É até curioso. Não faltam problemas sociais no Brasil, alguns sendo enfrentados com alguma eficiência, outros nem tanto. O problema da população pobre do Rio - que circunstâncias principalmente geográficas fizeram vizinha tanto dos bairros de classe média como dos redutos dos muito ricos - tem características particulares.
Até hoje, nem remoção nem urbanização deram certo em larga escala - apesar do bom resultado recentemente obtido no Morro Dona Marta. E os muros, aparentemente antipáticos, podem ter dupla vantagem: tanto proteger a comunidade de guerras entre traficantes locais e invasores, como impedir o crescimento das favelas nas florestas locais.
A delegação do governo Lula em Genebra não sabia nada disso. Não é exagero imaginar que o presidente também ignore aquilo que o ministro de Direitos Humanos não sabe sobre um tema que toca muito de perto sua área de ação.
As autoridades do Rio bem poderiam fazer um dossiê sobre favelas e muros e mandar uma cópia para Genebra e outra para Brasília. |
Nenhum comentário:
Postar um comentário