FOLHA DE SÃO PAULO - 31/05/09
Problema mesmo, para a corrente pelo terceiro mandato, é o tempo, melhor aliado dos contrários |
SÃO DUAS correntes de dimensões idênticas a dividir a opinião brasileira, entre favoráveis e contrários à permissão legal para Lula concorrer ao terceiro mandato -o que já valeria como um fenômeno eleitoral de presente inesperado e futuro de consequências incertas. Mas, com o fenômeno, vem um mistério: as duas correntes incorporam setores com grande capacidade de influência decisória, e a tendência é de uma disputa mais interessante, porque mais tática, do que as urnas propriamente.
A satisfação da camada de poder econômico está acima de todo o positivo que pudesse desejar de Lula. Aquele "eu estou com medo" que simbolizou, na disputa presidencial de 2002, o esperado de Lula pelos conservadores e o que as táticas da Guerra Fria lhes ensinaram, transformou-se em um sentimento próprio dos premiados.
"Lulinha paz e amor" neutralizou as inquietantes agitações do PT e de movimentos sociais, esvaziou o movimento sindical e suas greves e reivindicações, não mexeu nem no menor parafuso da estrutura socioeconômica: Lulinha pacificador. E com o Banco Central, fortalecido antes do caseiro falastrão pelo vivo Antonio Palocci, assegurou a proteção e a multiplicação do que compõe os objetivos permanentes dos conservadores: feito de Lulinha amoroso.
Onde não haja o velho direitismo extremado, seja ideológico ou religioso (ou este a fazer aquele), na classe média e daí para cima os que preferem a continuidade de Lula a qualquer risco são, diria a gíria, figurinhas fáceis. Por menos que se exponham -razões de classe, digamos. Atitude compreensível: a eleição de um adversário de Lula e do PT sempre será uma possibilidade de substituir paz e amor pela restauração das fermentações.
O que importa, diante da disputa que o empate das opiniões sugere, é que, mesmo minoritário na corrente desejosa do terceiro mandato, o lulismo conservador é parte da camada nacional que influi nas lideranças partidárias, nas práticas dos meios de comunicação e, daí, tanto na formação da opinião política como nas pressões mais diretas.
Mas nada disso é suficiente para subestimar a força política da corrente contrária ao terceiro mandato, localizada nos mesmos baluartes dos neolulistas. Na classe média, o grosso dos contrários a Lula parece estar na sua parcela mais participativa e com hábito de mobilização, uma espécie de zona sul carioca reproduzida nas capitais e cidades maiores. Aquela das marchas, das pinturas no rosto, dos slogans.
Em termos convencionais, a corrente do conservadorismo contrária ao terceiro mandato é mais forte, nem que seja porque mais numerosa, do que os favoráveis. Por si só, o embate já é interessante. Há, porém, um terceiro fator em campo: o contingente animado pelas bolsas disso e daquilo, pelos "nunca neste país" e "nunca mais neste país", pelas promessas grandiosas que independem de realização, os comícios diários em solenidades, em praça pública e, com fartura exaustiva, nos meios de comunicação.
Curiosa é a contradição nesse campo: nele há, em potencial, uma força imensa de mobilização e influência, mas o próprio Lula extinguiu-lhe, com a anulação do PT e do sindicalismo, a já precária capacidade de organização e ação consequente. O que não significa que a mobilização não possa ser recuperável. Ou seja, tudo vai depender, para um lado e outro, não só de sua força, mas, sobretudo, de sua tática.
Como sempre, Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, já antecipou o seu voto, caso o terceiro mandato resulte em julgamento: "Seria um casuísmo e inconstitucional". Pode ser, assim como a reeleição de Fernando Henrique terá sido uma coisa e outra. Seria inconstitucional se a Constituição não for submetida à necessária adequação para permiti-lo. Já o ministro Ayres Britto, aderente à moda antecipativa de Gilmar Mendes, previne que considera um terceiro mandato antirrepublicano, porque República exige o rodízio no poder. Mas, nem a ideia de República prevê prazos para rodízio, nem, como exemplo histórico, os Estados Unidos foram mais plenamente republicanos do que no período das quatro eleições sucessivas de Franklin Roosevelt.
Problema mesmo, para a corrente pelo terceiro mandato, é o tempo, melhor aliado dos contrários.
A satisfação da camada de poder econômico está acima de todo o positivo que pudesse desejar de Lula. Aquele "eu estou com medo" que simbolizou, na disputa presidencial de 2002, o esperado de Lula pelos conservadores e o que as táticas da Guerra Fria lhes ensinaram, transformou-se em um sentimento próprio dos premiados.
"Lulinha paz e amor" neutralizou as inquietantes agitações do PT e de movimentos sociais, esvaziou o movimento sindical e suas greves e reivindicações, não mexeu nem no menor parafuso da estrutura socioeconômica: Lulinha pacificador. E com o Banco Central, fortalecido antes do caseiro falastrão pelo vivo Antonio Palocci, assegurou a proteção e a multiplicação do que compõe os objetivos permanentes dos conservadores: feito de Lulinha amoroso.
Onde não haja o velho direitismo extremado, seja ideológico ou religioso (ou este a fazer aquele), na classe média e daí para cima os que preferem a continuidade de Lula a qualquer risco são, diria a gíria, figurinhas fáceis. Por menos que se exponham -razões de classe, digamos. Atitude compreensível: a eleição de um adversário de Lula e do PT sempre será uma possibilidade de substituir paz e amor pela restauração das fermentações.
O que importa, diante da disputa que o empate das opiniões sugere, é que, mesmo minoritário na corrente desejosa do terceiro mandato, o lulismo conservador é parte da camada nacional que influi nas lideranças partidárias, nas práticas dos meios de comunicação e, daí, tanto na formação da opinião política como nas pressões mais diretas.
Mas nada disso é suficiente para subestimar a força política da corrente contrária ao terceiro mandato, localizada nos mesmos baluartes dos neolulistas. Na classe média, o grosso dos contrários a Lula parece estar na sua parcela mais participativa e com hábito de mobilização, uma espécie de zona sul carioca reproduzida nas capitais e cidades maiores. Aquela das marchas, das pinturas no rosto, dos slogans.
Em termos convencionais, a corrente do conservadorismo contrária ao terceiro mandato é mais forte, nem que seja porque mais numerosa, do que os favoráveis. Por si só, o embate já é interessante. Há, porém, um terceiro fator em campo: o contingente animado pelas bolsas disso e daquilo, pelos "nunca neste país" e "nunca mais neste país", pelas promessas grandiosas que independem de realização, os comícios diários em solenidades, em praça pública e, com fartura exaustiva, nos meios de comunicação.
Curiosa é a contradição nesse campo: nele há, em potencial, uma força imensa de mobilização e influência, mas o próprio Lula extinguiu-lhe, com a anulação do PT e do sindicalismo, a já precária capacidade de organização e ação consequente. O que não significa que a mobilização não possa ser recuperável. Ou seja, tudo vai depender, para um lado e outro, não só de sua força, mas, sobretudo, de sua tática.
Como sempre, Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, já antecipou o seu voto, caso o terceiro mandato resulte em julgamento: "Seria um casuísmo e inconstitucional". Pode ser, assim como a reeleição de Fernando Henrique terá sido uma coisa e outra. Seria inconstitucional se a Constituição não for submetida à necessária adequação para permiti-lo. Já o ministro Ayres Britto, aderente à moda antecipativa de Gilmar Mendes, previne que considera um terceiro mandato antirrepublicano, porque República exige o rodízio no poder. Mas, nem a ideia de República prevê prazos para rodízio, nem, como exemplo histórico, os Estados Unidos foram mais plenamente republicanos do que no período das quatro eleições sucessivas de Franklin Roosevelt.
Problema mesmo, para a corrente pelo terceiro mandato, é o tempo, melhor aliado dos contrários.
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