As circunstâncias conspiram a favor da lógica. Os fatos é que não ajudam. Condenado por corrupção, Valdemar Costa Neto, dono do PL (antigo PR), compôs a bancada do mensalão na penitenciária brasiliense da Papuda. Desde então, criou-se para os presidentes que negociam cargos com partidos um dilema hamletiano: barrar Valdemar ou barrar Valdemar?, eis a questão. Jair Bolsonaro optou pela única alternativa não disponível.
O capitão da "nova política" recebeu as demandas do Valdemar, dialogou com Valdemar, barganhou com Valdemar... Eis que, de repente, Bolsonaro concordou em entregar para o Valdemar, entre outros cofres, a Secretaria de Vigilância em Saúde. O órgão pende do organograma do Ministério da Saúde. No momento, é chefiado por Wanderson Oliveira, cujo semblante e ponderação tornaram-se conhecido dos brasileiros graças à crise do coronavírus.
Wanderson compõe a mesa de autoridades nas entrevistas sobre o avanço do vírus. Cabe a ele trocar em miúdos os números da tragédia. Revelou-se um servidor público de mostruário. Egresso da Fiocruz, é doutor em epidemiologia. Dos seus 20 anos de carreira, dedicou 15 à pasta da Saúde. Pois Bolsonaro, veja você, resolveu trocar Wanderson por um apadrinhado do Valdemar. O nome do substituto ainda não veio à luz. Diz-se no Planalto que será um técnico. Conversa mole.
Na máquina estatal, não basta ser técnico. É preciso saber a serviço de quem estarão as habilidades técnicas. No caso da Secretaria de Vigilância em Saúde, o substituto de Wanderson subordinará seu talento aos interesses de Valdemar, não ao interesse público. Em condições normais, a troca seria apenas absurda. Em tempos de pandemia, o escambo ganha ares de escárnio.
Parafraseando o que disse aquele irmão Karamázov do Dostoiévski sobre a ausência do Todo-Poderoso —"Se Deus não existe, tudo é permitido"— pode-se concluir o seguinte: Se um afilhado do mensaleiro Valdemar chega ao comando da Secretaria de Vigilância em Saúde, tudo é permitido no governo Bolsonaro.
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