Avalanche de mentiras é tão grande que elas acabaram desmoralizadas
Além de facilitar de maneira extraordinária as comunicações planetárias, as redes sociais deram voz a quem não as tinha, ou que não conseguiam expandi-la de maneira a alcançar mais do que seu círculo íntimo. Foi uma extraordinária revolução que mudou a forma das pessoas pensarem e agirem e transformou a indústria. Mais diretamente as indústrias das comunicações e das telecomunicações, mas todas as outras sofreram consequências, muitas de maneira positiva. No Brasil, apesar de reveses por abusos contra a livre concorrência e pela disseminação de mentiras, tudo ia relativamente bem, até chegarem Jair Bolsonaro, seus filhos e o gabinete do ódio.
A onda global de fake news que causa forte impacto sobre as redes, sobretudo na Europa, produzindo um enorme dano às suas imagens, não pode ser comparada ao que se viu no Brasil destes últimos dias. Em todo o mundo as pessoas passaram a buscar informações sobre o coronavírus em fontes confiáveis, nos veículos profissionais de notícia, com medo de se contaminarem pelas fakes disseminadas. Aqui, a avalanche de mentiras é tão grande e contínua que as redes acabaram sendo desmoralizadas. O efeito dessa onda é de tal maneira devastador que até mesmo um post do presidente da República foi retirado do ar pelo Facebook por ser mentiroso, mas apenas depois de causar enorme estrago.
Membros de grupos de WhatsApp raramente recebem alguma coisa de primeira mão. Quando não é uma mensagem pessoal, quase tudo chega por redirecionamento. Fora as piadas, as orações e as sacanagens, o que mais se vê hoje em dia são campanhas contra o confinamento. Mesmo não se conseguindo identificar o autor material da obra, sabe-se perfeitamente quem teve a ideia e a quem ela serve. Os objetos da sua ira são quase sempre os mesmos, com destaque para a mídia. Geralmente são ataques rasos e burros, mas ainda assim há militantes cegos que os distribuem.
Além da imprensa e de partidos de oposição a Bolsonaro, esse ódio alcança também os poderes Legislativo e Judiciário. A mais nova peça distribuída é a que indaga por que deputados e senadores não abrem mão de seus salários e suas vantagens por exercício de função e redirecionam esse dinheiro para o combate ao vírus. É ridículo, mas tem gente que acredita, sem fazer os devidos cálculos, que o volume de recursos (de alguns milhões de reais) que seria alcançado com a medida exótica poderia resolver a guerra (de muitos bilhões de reais) contra o flagelo.
Mais uma vez, não precisa ser gênio para saber quem produziu essa pérola e quais os instrumentos usados para a sua distribuição. São os de sempre, os que culpam Congresso, Supremo e imprensa pelo fracasso extraordinário de um dos piores e mais absurdos presidentes da História do Brasil. Como todo o material é distribuído por uma rede eficientíssima de robôs, mais cedo ou mais tarde essas barbaridades vão acabar em seu celular, encaminhados por membro desatento de um de seus grupos.
É verdade que de um lado as redes têm altíssimo valor nessa pandemia, sendo usadas pelos entes oficiais da saúde para se comunicar e por empresas para se conectar e atender aos seus clientes. Por outro lado, elas têm sido instrumento para difundir contrainformações que podem resultar até em mortes. O fato é que por isso as pessoas começam a se desligar. Pode ser difícil, para alguns será como mergulhar no mar numa noite escura. Mas um pouco mais de cuidado com o que se lê e com o que se compartilha não fará mal a ninguém. Em alguns casos, é melhor cair fora mesmo.
Talvez não explique por que os Estados Unidos são líderes de casos e mortes por coronavírus, mas uma visita a qualquer aplicativo de voos em tempo real, como o “Aviões ao Vivo”, pode dar uma boa pista. No Brasil, ontem, às 12h34m, havia 18 aviões voando. Na Índia, quatro aviões ocupavam o espaço aéreo. Na Itália, havia dois, na França, sete. E nove sobrevoavam a Inglaterra. Nos Estados Unidos, era impossível contar, porque somavam centenas.
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