Devemos proteger as pessoas de sua própria ambição e de um modo de vida insalubre?
Na semana em que a aprovação da Previdência mostrou como será nossa vida no longo prazo, estreou um documentário que dá pistas do que pode acontecer num futuro mais próximo.
“Estou Me Guardando Para Quando o Carnaval Chegar” é centrado em Toritama (PE), cidade de 45 mil habitantes que se proclama a capital nacional do jeans.
Em fabriquetas de fundo de quintal, moradores trabalham até 15 horas por dia por conta própria costurando, tingindo, pregando zíperes e bolsos e dando acabamento em calças, bermudas, vestidos etc.
Quase ninguém é registrado (fichado, no termo local). Quanto mais se trabalha, mais se ganha, o que estimula um ritmo inclemente de produção. O único momento em que a cidade para é o Carnaval. Nem o famoso São João de Caruaru, ali perto, tem esse poder.
Estive em Toritama em março, e uma palavra que ouvi muito foi empreendedorismo. Algumas fábricas, de não mais que cinco máquinas de costura amontoadas, criam suas próprias marcas, modelos e ações de marketing.
Não sei o que Paulo Guedes está esperando para ir até lá, onde seu sonho liberal já é realidade, com menos direitos e desemprego quase zero.
Para um forasteiro como eu, choca um sistema que lembra a Revolução Industrial. Mas não consegui encontrar uma única pessoa que reclamasse (como também mostra o filme).
Se houvesse uma consulta sobre trocar a vida atual por uma com carteira assinada, salário fixo e direitos, a resposta seria um esmagador “não”.
Estamos diante, então, do que pode ser chamado de o dilema de Toritama: devemos proteger as pessoas de sua própria ambição e de um modo de vida insalubre, para dizer o mínimo?
Mas que direito temos nós, figuras bem-intencionadas, de interferir no livre arbítrio de quem quer apenas ganhar dinheiro? A discussão é atual e ultrapassa muito os limites desta cidade de ruas empoeiradas no agreste pernambucano.
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