Uma coisa são as mudanças tão intensas e tão abrangentes, como as que estamos vivendo em todo o mundo. E outra, bem diferente, é a percepção dessas mudanças. Isso lembra a história do sapo que salta imediatamente quando colocado em contato com água fervente, mas não sente o calor se o aquecimento acontece lentamente com ele dentro da panela.
A revolução digital, a indústria 4.0, o forte aumento da expectativa de vida, a metamorfose do emprego, o aquecimento do planeta... Tudo isso acontece ao mesmo tempo e com grande intensidade. No entanto, os padrões de medida e de avaliação continuam os mesmos, como se continuassem servindo para a realidade mutante.
Se, por exemplo, o emprego tal como conhecido até agora está se transformando e se as pessoas estão sendo cada vez mais obrigadas a garantir sua renda por meio de ocupação autônoma, por que seguir medindo o desemprego da maneira convencional?
Há duas semanas, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, argumentava que o projeto de criação do regime de capitalização da Previdência Social tal como redigido era inaceitável porque, entre outras razões, não previa a contribuição do empregador para a conta do beneficiário. Claro, é bem melhor contar com a contribuição da empresa. Mas, se o mundo caminha para uma economia de serviços em que predomina a ocupação por conta própria, por que insistir na contribuição da empresa e não prever o que acontecerá provavelmente com a maioria, que não terá seu ganha-pão e contribuições adicionais para a aposentadoria por meio de um contrato formal de trabalho?
Nesta terça-feira, o Estado publicou reportagem de Márcia De Chiara, que mostrou a enorme transformação pela qual vão passando os shopping centers. Cada vez mais o consumidor recorrerá às compras online. As lojas estão se transformando em showrooms, o fluxo de mercadorias já não obedece o trajeto anterior, mas passam a ser entregues a partir de centros de logística, muitas vezes localizados em outros municípios.
Essa pequena mudança implica outras transformações. Uma delas é no campo do emprego. A maior categoria de trabalhadores no Brasil, a dos comerciários, está sendo esvaziada. As lojas precisam cada vez menos de vendedores e podem substituí-los por menor número de consultores, encarregados de orientar o consumidor sobre a melhor escolha. Também o faturamento dos shoppings tende a cair porque as encomendas passam a ser feitas pela internet e isso reduzirá seu fluxo de caixa.
Na área da tributação, a coisa fica até mais complexa porque já não se sabe em que municípios acontece a compra. Por exemplo, o consumidor pode acionar uma operação por meio de um celular que, por sua vez, cai num centro de distribuição de outra cidade para uma mercadoria a ser entregue em endereço de outro município.
Se o objeto do comércio é um serviço, como um software, um texto, uma avaliação clínica, que pode ser gerado em outro país e determinar um lançamento de débito em cartão de crédito, já não se sabe que instituição pública tributará quem, como e em que localidade, e sob quais regras.
Enfim, os hábitos vão mudando. Na área do emprego, o trabalhador vai se dando conta de que não está preparado para executar as novas funções exigidas. Isso mostra quanto a educação e o ensino estão atrasados.
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