Nos finais de semana, a gente costumava receber folhetos de lançamentos de imóveis nos sinais de trânsito. O pessoal que fazia o bico dos folhetos havia desaparecido faz uns dois ou três anos, enquanto se via cada vez mais gente morando nas calçadas e catando coisas no lixo.
A multidão de mendigos e moradores de rua não parece diminuir. Mas a turma dos folhetos de imóveis reapareceu, faz uns dois ou três meses. Estatísticas parciais e precárias, além de conversas com gente do ramo, indicam que a catástrofe do setor imobiliário talvez esteja perto do fim.
Mesmo o conjunto da construção civil, que inclui a construção pesada, deu um sinal, precário e ainda incerto, de que pode ter começado a despiorar no trimestre encerrado em agosto.
Catástrofe não é um exagero. Na comparação anual, o investimento na construção civil ainda caía a mais de 6% em agosto, segundo indicador calculado pelo Ipea. Desde o início da recessão (segundo trimestre de 2014), o número de empregos formais na construção civil diminuiu 31% (no conjunto da economia, a baixa foi de 6,4%). Trata-se de 1 milhão de empregos.
De onde parecem vir os brotos verdes nos canteiros de obras? O valor dos imóveis lançados está perto de parar de diminuir, pelo dado calculado pela Fipe com base nos resultados das empresas da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc). O valor das vendas voltou ao azul (vendas de janeiro a agosto, ante igual período do ano passado).
É alguma coisa, mas é apenas menos desanimador. O valor anual dos lançamentos é quase 50% menor do que em dezembro de 2014; o de vendas, 31,5%.
A construção civil perde empregos com carteira assinada ainda no ritmo de 8,3% ao ano. Há estabilidade no fundo do poço, porém. Nos últimos quatro meses, desde junho, foi estancada a sangria do emprego com carteira dos operários da construção, na comparação mês a mês.
Nesta quinta (26), viu-se pelos dados de até setembro do Tesouro Nacional que a despesa de investimento do governo federal "em obras", no PAC, baixa 48% em relação ao ano passado. Foi de menos de R$ 16 bilhões, um troço ridículo. No ano, governo gastou no total R$ 933 bilhões.
Não há perspectiva de melhora no investimento federal em obras.
A alternativa, como se repete faz muitos meses nestas colunas, seria o governo fazer concessões de infraestrutura, contratar obras ou privatizar serviços em volume bastante para compensar o desastre do investimento federal direto. No entanto, fora os casos mais fáceis (vender aeroporto ou hidrelétrica prontinhos) ou menos difíceis (petróleo e linha de transmissão de energia), o governo não consegue tocar o programa de concessões. Assim, há escassa perspectiva de retomada de obras no ano que vem, a depender da turma de Michel Temer.
A construção civil é assunto central; é o setor que ora mantém o país estagnado. É metade do investimento total (que engloba construções residenciais, comerciais, industriais, infraestrutura, máquinas, equipamentos etc.). No entanto, fala-se da escassez de investimento como se se tratasse do tempo ou da chuva, como se fosse um fato da natureza, como se não fosse possível fazer nada para colocar alguma obra na rua.
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