Após as seguidas revisões para cima das projeções do mercado financeiro para o crescimento da economia brasileira em 2017 e em 2018, já há vários analistas indagando se o resultado bem melhor do que o esperado da arrecadação de impostos e contribuições federais em agosto foi apenas um soluço ou se a receita com tributos seguirá o bom exemplo da inflação, que vem surpreendendo positivamente nos últimos meses.
Se a arrecadação reagir numa magnitude maior do que a recuperação do Produto Interno Bruto (PIB), o que talvez ainda não esteja nos modelos de projeções de muitos analistas, haverá um impacto positivo importante para o governo conseguir atingir as novas metas de déficit primário para este ano e o próximo, ambas em R$ 159 bilhões.
A arrecadação de impostos e contribuições federais somou R$ 104,206 bilhões em agosto, um aumento real (já descontada a inflação) de 10,78% ante igual mês de 2016. O valor arrecadado foi o melhor para meses de agosto desde 2015 e ficou acima da mediana das estimativas dos analistas, que era de R$ 98,700 bilhões.
O economista-chefe da Porto Seguro Investimentos, José Pena, lembra que a surpresa com a atividade econômica tem sido, sobretudo, com o desempenho do consumo.
“Meses atrás, havia um certo consenso entre os analistas de que o investimento fixo lideraria a retomada”, diz Pena. “O quadro atual, embora não muito favorável para o crescimento sustentável de longo prazo, é relativamente favorável para a arrecadação, pois a estrutura tributária no Brasil é bastante centrada em renda e consumo.”
Para ele, a eventual retomada mais forte do crédito e a queda da inflação preservando renda real ajudam no cenário mais positivo para o desempenho do consumo, logo, da arrecadação. “Por exemplo, os Estados se beneficiariam através do ICMS”, diz.
É bom lembrar que o consumo das famílias, com alta de 1,4% sobre o primeiro trimestre de 2017, foi o motor do crescimento do PIB no segundo trimestre, o qual registrou expansão de 0,2%, melhor do que a estimativa de estagnação. Após esse resultado, os analistas começaram a melhorar as projeções do PIB em 2017.
Na mais recente pesquisa Focus, a estimativa de crescimento do PIB subiu para 0,68% neste ano, mas não são poucos os analistas que estimam uma expansão de 1%. Para 2018, o consenso dos analistas agora é de uma alta de 2,30% do PIB, mas há projeções acima de 3%.
Já o economista-chefe do banco Safra, Carlos Kawall, observa que há sempre oscilação nos resultados da receita por fatores não previsíveis, como a oscilação na arrecadação relativa a bancos, que caiu em julho e se recuperou em agosto.
“Não obstante isso, entendemos que a recuperação do consumo e da atividade industrial, que são mais tributados, além da massa salarial em alta, sugere que a arrecadação deve continuar melhorando”, afirma Kawall.
Os analistas da consultoria Rosenberg Associados esperam um crescimento real de 1,3% das receitas federais em 2017, interrompendo três anos de queda real consecutiva. Essa estimativa tem como base a projeção da consultoria de uma expansão de 0,7% do PIB neste ano e da entrada de receitas extraordinárias.
Mas a surpresa positiva da arrecadação pode ser maior em momentos de recuperação da economia?
“Aqui a surpresa seria uma recuperação da elasticidade de crescimento da receita tributária, que caiu muito na crise”, explica Kawall, do Safra. “Isso está ligado à maior lucratividade das empresas, recuperação da massa salarial (por conta das receitas previdenciárias) e o crescimento de consumo e indústria, atividades mais tributadas.”
Para ele, as tendências são favoráveis a que isso aconteça, uma vez que o mercado de trabalho se estabilizou, as empresas devem mostrar melhores resultados, o consumo se recupera e a indústria também está em processo de retomada.
Kawall crê que, se a arrecadação surpreender este ano, provavelmente o governo aumentará o descontingenciamento de despesas. Para o ano que vem, uma receita maior deverá implicar em um resultado primário melhor que a meta, uma vez que não haverá espaço para elevar despesa, que já estará no limite permitido pelo teto do gasto. “Ou seja, o teto começa para valer no ano que vem”, diz.
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