Trump é um ególatra que incomoda até republicanos. Mas a enxurrada de ataques que ele recebe é totalmente desproporcional ao que acontece com Hillary
No filme Tempo de Matar, de 1996, a cena mais marcante é quando o advogado, personagem de Matthew McConaughey, pede para que os jurados fechem os olhos e passa, então, a contar em detalhes o caso da garotinha que foi estuprada. Somente ao fim ele diz: “Agora imaginem que ela é branca”. Jogada de mestre, já que o estupro tinha ocorrido no sul racista dos Estados Unidos, com uma vítima negra.
O símbolo da Justiça tem os olhos vendados justamente para buscar a imparcialidade, não enxergar quem está sendo julgado, mas sim seus atos. Claro que isso é quase impossível na prática, mas deve ser um ideal sempre em mente. E, se naquela época e lugar a “raça” era um fator de preconceito, hoje é inegável que a visão ideológica prejudica qualquer isenção.
Não pode haver sombra de dúvida de que a imprensa em geral adota um duplo padrão, julgando com muito mais severidade os atos equivocados quando cometidos por um republicano em vez de um democrata. Há um viés ideológico evidente na mídia, que tende a aliviar a barra da esquerda e pegar pesado com os conservadores. Não é preciso abraçar teorias conspiratórias: a maioria dos jornalistas é de esquerda mesmo, e o viés vem naturalmente.
Basta pensar no recente escândalo envolvendo Donald Trump. Em uma conversa privada de “vestiário”, ocorrida há 11 anos, o magnata se gaba de avançar sobre mulheres usando seu poder. Ridículo, sem dúvida. Mas algo comparado ao que efetivamente fez Bill Clinton quando era presidente, assediando estagiárias? O marido de Hillary é acusado inclusive de estupro, mas a imprensa não liga tanto assim: chegou a chamar os conservadores de “moralistas” para defender Bill na época.
A imprensa permite que Hillary banque a feminista indignada mesmo que ela tenha apoiado seu marido “predador” contra aquelas mulheres. Ou dá pouca atenção ao caso em que a advogada Hillary defendeu um estuprador de uma menina no passado, e riu com sua absolvição. O leitor talvez nem saiba desses detalhes, mas certamente sabe da fala idiota do republicano.
Trump é mesmo um ególatra que incomoda até republicanos. Mas a enxurrada de ataques que ele recebe é totalmente desproporcional ao que acontece com Hillary ou acontecia com Obama. Se Trump tivesse feito as mesmas coisas que esses democratas, ele seria massacrado ainda mais pela imprensa. A seletividade é visível.
Hillary tem várias declarações defendendo um combate mais duro contra imigrantes ilegais, atacando o México por sua leniência com eles, e pregando até mesmo, pasmem!, o fortalecimento de uma “barreira” para impedir a entrada dos ilegais. Mas, quando a fala sai da boca de Trump, isso é prova de sua “xenofobia”, de seu “racismo”; quando vem de Hillary, é prudência e defesa do império das leis.
Alguém consegue imaginar como seria o tratamento com Trump se ele tivesse apagado milhares de e-mails secretos de seu servidor pessoal? E se uma fundação sua tivesse negócios suspeitos com governos como o da Arábia Saudita? Os Clinton estão na política há décadas e amealharam uma fortuna de mais de US$ 200 milhões. Mas é a riqueza do empreendedor de sucesso que desperta revolta?
Inúmeros outros exemplos poderiam ser dados, mas o leitor já entendeu o ponto. O respeitado acadêmico Dinesh D’Souza comparou Hillary e Bill ao casal Bonnie e Clyde, que vivia aplicando golpes durante a Grande Depressão. Só que os Clinton usam o poder estatal para enganar os outros e acumular fortuna e poder, tudo com muitas mentiras.
A mídia, porém, costuma ser benevolente com ambos, enquanto parte para cima de qualquer deslize de Trump. Como o bilionário é mesmo um bufão, é um prato cheio. Enquanto isso, a mentirosa se safa e deverá ser eleita. Triste destino para a América...
Rodrigo Constantino, economista e jornalista, é presidente do Conselho do Instituto Liberal.
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