O regime de metas de superávit primário (saldo do orçamento antes do pagamento de juros) foi um avanço para a gestão governamental brasileira. Criado em 1999, esse mecanismo contribuiu para impor um princípio fundamental no trato do dinheiro público, que é a responsabilidade fiscal. Foi determinante para melhorar a confiança dos investidores no país, permitiu controlar a dívida pública e reduziu o risco Brasil apurado pelas agências internacionais. De um modo geral, serviu como uma das bases para o processo de estabilização econômica iniciado nos anos 1990.
No ano de 2009, esse mecanismo começou a ser desmontado com a exclusão, pelo governo federal, dos gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Dai em diante, inúmeras invenções contábeis destruíram este fundamento macroeconômico. Em pouco tempo, saímos de superávits primários nas contas públicas para déficits primários crescentes. Segundo um levantamento da consultoria Tendências, o governo manipulou, apenas entre 2009 e 2012, R$ 590 bilhões para obter o resultado que queria. As metas foram alcançadas por conta de uma contabilidade criativa , mas a realidade era outra.
Entre 1999 e 2008 o governo federal registrou superávits primários médios de 2,2% do Produto Interno Bruto (PIB). No período de 2009 e 2013, o saldo superavitário foi reduzido para 1,7% do PIB, tendo como um dos motivos o expressivo aumento de gastos. O resultado só não foi pior em função das manobras contábeis que esconderam a degradação orçamentária. Passada a eleição presidencial, veio a realidade da situação financeira do país. O superávit primário virou um déficit primário de 0,36% do PIB em 2014 e 1,98% do PIB em 2015. A dívida pública se tornou explosiva e abalou a confiança dos investidores. Entre 2013 e 2015, o endividamento saltou de 34% para 44% do PIB.
O novo governo terá uma missão árdua para reequilibrar as contas do país, a partir de agora. É bem possível que os responsáveis pela destruição das contas públicas brasileira passem a dizer que a atual gestão está levando o país à bancarrota.
Em 2015, o déficit do governo federal foi recorde, chegando a R$ 115 bilhões. Este ano, o rombo deve superar R$ 170 bilhões e, de acordo com o Projeto de Lei Orçamentário para 2017, o saldo no próximo exercício será de R$ 139 bilhões negativos.
A má gestão orçamentária dos últimos anos criou uma situação de descalabro nas contas públicas e, por conta disso, o país está convivendo com um severo ajuste fiscal e uma profunda recessão. É o preço que o brasileiro está pagando por causa de intervenções desastradas do governo na economia e pelas ações populistas e irresponsáveis que destruíram fundamentos que levaram anos para serem consolidados.
Em junho de 2013, em uma audiência pública na Câmara dos Deputados, o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, exaltava a política econômica, dizendo que não há como questionar a solidez das contas do governo . Foram palavras sem fundamento que hoje cobram seu preço, através de inflação, desemprego e recessão.
A irresponsabilidade fiscal do governo do PT fez o país andar para trás. Será preciso recuperar novamente a credibilidade das contas públicas, obtida a duras penas a partir dos anos 1990. A retomada do crescimento econômico sustentado depende muito desse processo de reparação do orçamento da União.
Doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas (FGV)
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