O Brasil tem mais medalhas do que renda per capita, educação e saúde, como é ou deveria ser sabido. No pódio olímpico, estamos em lugar muito mais alto que no pódio socioeconômico.
Depois dos anos do Brasil Grande, segunda edição, agora também temos mais estádios grandiosos e subutilizados do que nunca, de futebol ou outros, alguns encaminhados talvez à ruína como aqueles do Pan do Rio, 2007, investimentos improdutivos desde sempre. Os anos de pindaíba do governo vão limitar ou até asfixiar o subsídio esportivo.
O que fazer ou como tratar desses nossos sonhos de supremo prestígio esportivo, outra tentativa de falsear realidades subjacentes difíceis?
Nos Jogos do Rio, a equipe brasileira teve seu melhor desempenho. Em número e cores de medalhas, foi quase idêntico ao da Grécia que sediou os Jogos de 2004. Os estádios gregos decaem em ruínas. Logo depois de Atenas 2004 (16 medalhas, 6 de ouro), o esporte grego regrediu a duas de prata e duas de bronze nas Olimpíadas de 2008 e 2012. Em 2010, a Grécia faliu. Hum.
"O melhor desempenho desde sempre" porém difere pouco daquele que as equipes brasileiras vêm conseguindo desde Atlanta, 1996, Olimpíada que marcou uma virada nos nossos resultados até então acanhados e quase simbólicos, sem desprezo pelos esforços e feitos individuais do passado.
Nesses 20 anos, o time do Brasil têm ficado em torno do 20º lugar no ranking, com cerca de 1,5% do total dos pódios e 14 medalhas por Olimpíada, em média. Nos 20 anos anteriores, as equipes levavam 0,6% do total de medalhas, quatro delas por Olimpíada, em média.
Países de renda semelhante ou população grande não vão nem de longe tão bem na Olimpíada: México, Índia, Indonésia. China e ex-comunistas são exceções sabidas.
A renda por cabeça, o PIB per capita do Brasil, anda em 72º lugar. Pelo Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH da ONU, que combina indicadores de renda, saúde e educação, em 75º lugar mundial.
A desigualdade de renda ainda anda pelo grupo das dez piores. Estamos "muito bem" ainda nos rankings de incidência de homicídios, de mortes no trânsito ou de taxas de juros etc. —ainda melhor que no quadro de medalhas. Temos tanta possibilidade de progresso quanto aberrações cruciais, de classe mundial.
Até pelos nossos tamanhos e desigualdades de renda e poder, no entanto, desenvolvemos capacidades avançadas, ao lado de manias ansiosas e inseguras de grandeza. Trata-se em parte de um efeito perverso do nosso "desenvolvimentismo" do século passado, de altíssimo padrão de consumo para uma elite minoritária, muita vez subsidiada pelo Estado, em detrimento do investimento em infraestrutura social: escola, posto de saúde, esgoto.
Parte de nós dispomos de hospitais, pesquisa, universidades e luxos que não existem em países comparáveis, assim como de misérias extensas e extremas, revoltantes, dado o nosso nível de renda e recursos. Talvez a ânsia de medalhas se inscreva na história desse nosso intuito de grandezas meio sem fundamentos.
Não precisa ser assim, claro. Em vez de pirâmides das manias de grandeza, esportivas ou outras, poderíamos começar por baixo, para que as crianças bem tratadas decidam (ou não) virar medalhistas.
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