sábado, julho 23, 2016

Mudança de sinais - MÍRIAM LEITÃO

O Globo 23/07

Uma pesquisa feita no setor de eletrônicos mostrou que 42% dos associados esperam aumento das vendas neste segundo semestre, percentual maior do que os 33% que esperam queda. A confiança na indústria subiu pelo quinto mês. Os sinais de mudança de humor, como temos dito, estão espalhados pelo mercado e pela economia real. Mas ainda são frágeis e dependentes do quadro político.

A sondagem foi feita pela Abinee (Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica) em junho, mas ainda não havia sido divulgada. Além desse sinal positivo, houve desaceleração nas demissões do setor em maio, que caíram ao menor nível desde fevereiro de 2015, segundo a entidade.

— Há muito tempo não víamos indicações de vendas superarem as de queda em nossas sondagens. Esta semana ouvi de um empresário que ele já está com crescimento das encomendas. A melhora de ânimo que se vê no mercado financeiro pode estar começando a chegar na economia real —afirmou Humberto Barbato, presidente da Abinee.

Na visão do executivo, a partir de setembro será possível medir a intensidade desse processo, porque nesse mês a indústria começará a receber os pedidos para o Natal. Ele avalia que a interinidade do governo Temer é um impeditivo para a volta mais forte da confiança porque a incerteza continua elevada. Além disso, ainda não houve a aprovação de nenhuma reforma relevante no Congresso.

— Mesmo com a melhora da confiança, ninguém vai tirar da gaveta projetos de investimento em um governo interino — afirmou.

No setor de papelão ondulado, que é considerado um termômetro do nível de atividade, o mês de junho apontou alta de 3% sobre o mesmo mês de 2015, e tudo indica uma nova alta em julho, segundo Sergio Ribas, diretor da ABPO. Mas ele ressalta que a base de comparação é muito fraca e não está claro se esses números são uma nova tendência. Ele também avalia que a interinidade do atual governo é um entrave para a recuperação.

— Tivemos dois meses estáveis, em abril e maio, crescimento em junho, e acredito que julho terá nova alta. Percebo que há uma vontade muito grande do empresário de que a recuperação dê certo. É muito importante que o governo deixe de ser interino e apresente propostas concretas. Se acontecer, acredito que a recuperação pode se intensificar — disse Sérgio Ribas.

Outro problema para a retomada, na visão da ABPO, é o medo do desemprego. O consumo vai demorar a reagir porque mesmo quem está empregado tem preocupação de perder a vaga. Com isso, evita as compras e os financiamentos. Além disso, avalia que as empresas estão com muita ociosidade e vão tentar aumentar a produção com as equipes mais enxutas.

— O desemprego não vai cair na mesma intensidade que subiu, e isso vai afetar o consumo, e consequentemente, os investimentos — disse Ribas.

O setor de máquinas continua sofrendo muito com os juros elevados, a pouca confiança para os investimentos e, agora, a valorização do real. O presidente da Abimaq, José Velloso, acha que o governo Temer está emitindo sinais ambíguos na questão fiscal e isso está impedindo a redução dos juros, como ficou claro na decisão do Copom deste semana.

— O governo está aceitando dar aumento de salários para vários grupos. Quanto mais tempo demorar para equilibrar o Orçamento, mais tempo levará para derrubar a Selic. Meu setor está sem capital de giro e asfixiado pelas taxas de financiamento — disse.

Os três executivos ouvidos pela coluna temem que o BC utilize a valorização do real no combate à inflação. Isso tiraria a competitividade dos exportadores e aumentaria a presença dos importados.

— Já há empresas levando prejuízo porque exportaram com câmbio em R$ 3,60 e agora a taxa voltou para R$ 3,25. Uma forma de crescer na crise é tentar substituir as importações. Meu setor já perdeu mais 80 mil postos de trabalho em quatro anos. Com esse câmbio e esses juros, não vai se recuperar — explicou Velloso.

Há as reclamações de sempre dos empresários, e as preocupações novas. Os sinais de melhora precisam se consolidar. A confiança está voltando, mas com um pé atrás.


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