Não há fórmula mágica para reduzir o rombo das contas públicas. Em clima de quase euforia, o governo interino de Michel Temer passou a tratar, nos últimos dias, a securitização de dívida tributária parcelada pelos contribuintes como uma fonte de receita capaz de mitigar o déficit e garantir o cumprimento da meta.
O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, chegou até mesmo a incluir a venda desses créditos que o governo tem a receber como uma das alternativas mais viáveis para evitar um novo contingenciamento.
Cifras variadas começaram a pipocar – R$ 15 bilhões, R$ 55 bilhões e R$ 60 bilhões –, para mostrar o potencial de arrecadação depois que o projeto do ministro das Relações Exteriores, José Serra, entrou na pauta de votação do Senado, com apoio da equipe econômica.
A orientação no governo foi agilizar a securitização que permite à União, Estados e municípios embalarem essas dívidas parceladas, mais conhecidas popularmente como “Refis”, para vender à iniciativa privada. São créditos considerados de melhor qualidade, porque já foram parcelados e, por isso, com mais chance de serem pagos pelos devedores. Uma forma de antecipar para o curto prazo receitas que o governo só receberia daqui a anos. Uma ajuda e tanto no momento de recessão e queda brusca da arrecadação.
Mas o que não veio a público até agora é que nos bastidores do governo está sendo travada uma discussão técnica e complexa que pode mudar o enredo dessa história. O Banco Central resiste em registrar a arrecadação da securitização como receita primária, que é aquela justamente utilizada para a verificação do cumprimento da meta.
No Brasil, cabe ao BC definir essas regras. Por enquanto, o banco avalia que esse dinheiro é uma receita financeira, que não deveria entrar no cálculo. Se esse entendimento prevalecer, toda a arrecadação que o governo vier a receber não poderá ajudar no cumprimento da meta fiscal. A euforia em torno do projeto como uma salvação da meta pode murchar.
Os defensores da proposta consideram que o BC está errado em querer classificar essas receitas dessa forma. Para eles, não há compromisso financeiro futuro do governo caso o crédito não seja honrado pelos devedores. O risco será de quem comprou a dívida.
Para não deixar dúvidas, uma cláusula de proteção foi incluída pelo relator do projeto, deixando claro que não se trata de uma operação de crédito.
Será que o BC vai bater o pé para manter essa interpretação da norma se o presidente Temer insistir em dar prioridade à securitização? Muitos acreditam que não.
Emissários já foram enviados à instituição para acabar com as resistências, que se somam às do TCU. O Tribunal de Contas considera que a venda dos créditos pode ser caracterizada com uma operação de crédito. O governo pediu um novo parecer. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), que cobra a dívida tributária, também não vê com simpatia.
A polêmica técnica não desmerece o projeto e nem muda o fato de que a arrecadação com a securitização vai ajudar a abater a dívida pública. Afinal, colocar a dívida numa trajetória sustentável é o objetivo último pelo qual o governo persegue uma meta fiscal.
Alguns Estados já fizerem esse tipo de operação, entre eles, São Paulo. Outros, como o Paraná, esperam as condições do mercado melhorarem para lançar a venda.
O fato é que o governo não pode colocar a proposta de securitização entre as suas fichas mais valiosas para incrementar as receitas, como fez a equipe de Dilma Rousseff com a repatriação de recursos enviados ilegalmente ao exterior. Muito menos tentando convencer de que algo poderá ser feito ainda este ano.
Ao contrário do que vende o ministro Padilha, o projeto, mesmo que aprovado, vai demorar para ser operacionalizado. Não é tábua de salvação para o ajuste fiscal.
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