quinta-feira, junho 23, 2016

Sem espaço - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 23/06

Não adiantou de nada as palavras respeitosas que o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, proferiu sobre os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A decisão de ontem de torná-lo mais uma vez réu por corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas demonstra que Cunha não tem mais espaço para escapar de punições.

A derrota mais sofrida, no entanto, deve ter sido a de desmembrar os processos, levando para o juiz Sérgio Moro, em Curitiba, os casos da mulher de Cunha, Cláudia Cruz, e de sua filha. Chamou a atenção no julgamento de ontem a explicitação de elogios ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, feitos por diversos ministros, principalmente pelo relator dos processos da Lava-Jato no STF, ministro Teori Zavascki.

Depois dos ataques que Janot vem sofrendo por parte dos parlamentares, estando, inclusive, sob a ameaça de um pedido de impeachment, não foi com certeza um acaso que elogios a seu trabalho tenham sido proferidos durante a sessão de ontem, quando a maioria dos ministros seguiu seu parecer.

Teori chegou a dizer que procura sempre seguir os votos do procurador-geral, porque considera que nesta fase de investigação é preciso dar apoio ao Ministério Público. Há latente nas declarações e votos dos ministros do Supremo a preocupação de unificar posições a favor das investigações do Ministério Público, para descaracterizar a imagem de que as acusações são levianas ou irresponsáveis.

Essa ideia vem sendo disseminada por congressistas de diversos partidos, e tem o objetivo de explorar eventuais desencontros entre delações premiadas para desvalorizá-las. Os procuradores de Curitiba estão sob o holofote dos políticos, e a visita do ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, à força-tarefa em Curitiba não foi à toa.

Além do apoio declarado à continuidade das investigações, o governo Temer pretende passar a ideia de que não se alia aos que querem limitar as ações dos procuradores que, a partir de Curitiba, desenvolvem as investigações da Lava-Jato.

Também o próprio presidente Michel Temer, ao dizer que Janot está apenas cumprindo seu papel ao denunciar políticos, e que não vale a pena analisar o pedido de impeachment, está dando o aval de seu governo ao prosseguimento das investigações, mesmo quando seu partido está no centro delas, em especial líderes como Renan Calheiros e José Sarney.

O exagero do pedido de prisão desses políticos por Janot já ficou estabelecido pelo não acatamento dele por Teori, mas essa decisão contrária não deve ser interpretada como uma fragilização do trabalho do Ministério Público.

Quando muito, foi uma sinalização de que o relator no Supremo assume o papel de estabelecer os limites de atuação do Ministério Público, mas sempre ressaltando que, na maior parte dos casos, concorda com os pedidos do procurador-geral.

A mesma coisa aconteceu em relação ao juiz Sérgio Moro, que levou uma espécie de carão de Teori — que anulou a gravação da conversa entre a presidente afastada, Dilma Rousseff, e o ex-presidente Lula, mas manteve a possibilidade de levar adiante o processo de obstrução da Justiça, com base em outras provas, que continuaram intactas.

Agindo assim, o STF cuida de que as investigações da Lava-Jato continuem prestigiadas, sob o controle atento da última instância, para evitar recursos protelatórios como os que Cunha vem apresentando.

O fato de o recurso contra a ida, para a instância de Moro, dos casos da mulher e da filha de Cunha ter sido recusado pelo plenário do Supremo pode detonar novas atitudes do presidente afastado da Câmara, apesar de ele ter garantido que não renunciará nem fará delação premiada.

O tempo de Cunha está se esgotando rapidamente, e ele terá que pensar rápido para não passar o momento certo de agir.

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