Folha de S. Paulo - 13/05
Michel Temer teria dois caminhos a seguir a partir do momento em que se tornou uma certeza o afastamento de Dilma Rousseff da Presidência, na votação da admissibilidade de seu impeachment pela Câmara em abril.
Poderia ousar e fazer o tal "ministério de notáveis", encaminhando reformas políticas estruturantes ao lado das decantadas medidas econômicas. Ou poderia seguir dentro da tradição política brasileira, a busca de consensos, focando no problema mais imediato: a crise econômica.
A montagem e a estreia de seu governo sugerem a opção pela segunda hipótese até aqui. Não só pelo caráter conservador do interino, mas também pela realidade: por mais que a "velha política" esteja sob fogo desde os protestos de 2013, não se achou ainda alternativa. Como pontuou Temer em seu discurso inaugural, "não será fácil".
Assim, o ministério foi gestado de forma a agradar os principais atores de Brasília; a presença de um sorridente Aécio Neves em lugar de destaque na "posse" de Temer não foi casual. O peemedebista sabe que sem uma agenda mínima emplacada rapidamente, sofrerá pressão do mercado e ameaças no Senado que ainda vai julgar Dilma –apesar de hoje as chances de a petista voltar para o poder serem negativas, prudência sempre é recomendável.
Acertos heterodoxos, como um turbinado Ministério dos Transportes manter as pastas que agregou com partidos diferentes, terão de ser testados. A fusão Previdência-Trabalho tentada por Dilma em 2015 fracassou, para ficar num exemplo próximo de outro simulacro de enxugamento administrativo.
O desenho de Temer, evidenciado nos acenos em seu discurso, é quase parlamentarista. Ele trouxe uma maioria de congressistas para o gabinete, deixando a economia com quem é do ramo.
No geral, a fotografia não é bonita. Falta diversidade naquele mar de senhores brancos com ternos de gosto duvidoso e, em alguns casos, prontuários carregados de suspeitas. Um ministério mais ético e plural em gênero e raça não garante melhor governo, mas no século 21 é impensável a mera replicação do plenário da Câmara na Esplanada. Mas Temer fixou uma meta que precisa da representação que está aí, e hoje risco de imagem parece ser o menor a que se expõe.
Do ponto de vista retórico, o interino estreou no púlpito visando acomodar todas as críticas que recebe. Defendeu Lava Jato, programas sociais, direitos trabalhistas, emprego, combate à inflação e, acusado de golpismo, prometeu usar como régua o "livrinho" —como o presidente Dutra chamava a Constituição.
Fracassou ao recorrer ao anódino clichê da "salvação nacional", tão anos 50, mas dialogou com as ruas de 2013 ao falar das demandas por eficiência nos serviços de um Estado de resto nominalmente mais liberal, aberto.
Fiel à fama, adotou tom conciliador. Estendeu até uma mesura a Dilma, para quem pediu "respeito institucional" dos hostis presentes. Os petistas vão considerar a fala tardia ou hipócrita, mas não deixa de ser raridade no tom das manifestações públicas no Planalto.
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