O GLOBO - 20/03
O ex-subprocurador-geral da República, Eugênio Aragão, resolveu mostrar para Lula toda sua lealdade e, nomeado ministro da Justiça, desandou a falar contra a Operação Lava-Jato. Ameaçou afastar de investigações criminais delegados e agentes suspeitos de vazamento de informações sigilosas, e classificou de "extorsão" o método usado pelos procuradores para obterem as delações premiadas.
Aragão é o mesmo a que o ex-presidente Lula se referiu numa conversa com seu ex-ministro Paulo Vannuchi, dos Direitos Humanos, quando se queixava da atuação dos procuradores do Ministério Público: "O problema é o seguinte, Paulinho. Nós temos que comprar essa briga. Eu sei que é difícil, sabe. Eu às vezes até fico pensando se o Aragão deveria cumprir um papel de homem naquela porra, porque o Aragão parece nosso amigo, parece, parece, parece, mas tá sempre dizendo 'olha. sabe, porra'", diz Lula para Vannuchi.
As declarações recentes de Aragão provocaram uma reação vigorosa da Associação Nacional dos Delegados, que amanhã se reunirá para decidir se entra na Justiça com um mandado de segurança para impedir afastamentos preventivos de policiais federais. Também o deputado federal Raul Jungmann entrará com uma ação em defesa da imparcialidade na atuação da Polícia Federal. Impetrará um mandado de segurança coletivo no STJ contra o ministro, para impedir que ele dê ordens ou orientações para a substituição sumária ou arbitrária de equipes de agentes da Polícia Federal envolvidos na Lava-Jato, sem a apuração e demonstração adequada dos fatos que a justifiquem.
O deputado do PPS, que foi o autor da ação no Supremo que redundou na saída do ministro da Justiça anterior, entrou também com outra ação do mesmo teor no Supremo Tribunal Federal contra Aragão. A ministra Cármen Lúcia já deu dez dias para que o novo ministro se defenda, e Jungmann acha que até lá ele não deveria tomar nenhuma medida.
"O mais interessante seria o pedido de liminar determinar que, para evitar prejuízos ou dúvidas durante a tramitação do mandado de segurança, o ministro, pessoalmente ou por seus subordinados, se abstenha de dar ordens ou orientações a qualquer membro da PF a não ser por ato administrativo escrito e autuado em expediente administrativo regular, bem como de se reunir ou se comunicar com qualquer autoridade da PF sem o registro completo do conteúdo das conversas, por meio eletrônico, que deve ser conservado para apresentação imediata à autoridade judicial, caso requisitado".
Aragão também é membro do Ministério Público, mas como fazia parte da instituição antes da Constituinte de 1988, que proibiu que seus membros fossem nomeados para o Poder Executivo ou exercessem outras funções que não o magistério, se considera apto a assumir o ministério. Não é esse o entendimento do STF, defende Jungmann, baseando-se em um acórdão do ex-ministro Eros Grau, aprovado pelo plenário, que diz que os procuradores anteriores à Constituinte podem optar por manterem garantias e vantagens burocráticas da carreira, mas não estão isentos das proibições que visam garantir a independência dos poderes.
Até mesmo no Conselho Superior do Ministério Público Federal, que tem um entendimento mais flexível sobre a interpretação da Constituição e autorizou a posse de Aragão no ministério, o relator do caso considerou que ele não tinha condições de assumir o Ministério da Justiça porque, segundo o subprocurador-geral da República, Carlos Frederico Santos, não fez a opção pelo regime anterior, conforme exige a Constituição Federal.
No mesmo parecer, o subprocurador diz também que há conflito de interesse na nomeação, pois Aragão até recentemente era subprocurador-geral eleitoral, por três anos, o que o impediria de ser subordinado "àqueles que participaram do pleito passado", comprometendo a independência do Ministério Público.
O temor diante das intempestivas declarações do recém-nomeado ministro é que ele tenha sido nomeado justamente para conter as investigações da Lava-Jato.
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