FOLHA DE SP - 21/01
O tumulto na finança mundial ofereceu motivo de última hora para o Banco Central manter os juros na mesma. Não seria preciso pretexto, caso a conversa do BC fosse melhor. De resto, a muvuca financeira começou na virada do ano; a reviravolta do BC, na terça de manhã.
Na nota obscura em que anunciou sua decisão, o BC pareceu dizer que levou em conta a recessão horrenda e "...a elevação das incertezas domésticas e, principalmente, externas".
Citou ainda as "perspectivas de inflação". Isso quer dizer que o BC fez contas novas e descobriu que o IPCA vai cair? Ou que, por ora, é melhor dar um tempo, ficar parado e tolerar o risco de IPCA ir a 8% ou 10% em 2016?
Quanto às "incertezas domésticas", elas por ora não auguram boas coisas para a inflação, embora um desastre recessivo maior possa deprimir salários e preços. É isso?
Quanto à situação externa, a coisa está, sim, meio sinistra. Mas o que preocupa o BC? Além do mais, dadas a decisão de ontem e a desordem mundial, para onde vai o dólar?
Nos dias de medo, o pessoal do dinheiro grande lá fora desanda a falar num palavreado hiperbólico. Coisas como "não vai ser 2008, mas pode ser como 2001-02", lembrança do estouro da bolha de ações das empresas de tecnologia da moda e da contabilidade criminosa nos EUA. Há quem fale de "credit crunch", seca de crédito, quando bancos reduzem empréstimos à míngua, por medo de calotes.
Os menos exagerados relembram 2013. Então, os donos do dinheiro tiveram reação histérica à mera menção de que os juros subiriam nos EUA, o que viria a ocorrer só no final de 2015. Há quem lembre também a crise europeia de 20011-12.
Não há clareza a respeito dos motivos da derrocada nos mercados financeiros. Há mal-estar com a decadência do ritmo chinês, que prejudica o crescimento e a capacidade de pagamento de países "emergentes" e/ou muito dependentes de commodities. Há a derrocada do petróleo, que arrebenta alguns emergentes e pode levar petroleiras à falência.
O risco de quebra de petroleiras seria um motivo mais específico do medo, mas pode se tratar de apenas um bom chute, pois o problema ainda é nebuloso. Bancos e outros credores sofreriam um baque, claro. De qual tamanho? Se a finança estima que a coisa vai ser feia, pode começar a se livrar de outras dívidas mais arriscadas, derrubando preços em vários setores e secando alguns canais de crédito.
A moeda chinesa pode ser um problema. A China padece de fuga de capitais. A fim de evitar desvalorização maior de sua moeda, o yuan, o país vende reservas (dólares). Para fazê-lo, enxuga a quantidade de dinheiro na praça doméstica, o que não pega muito bem para uma economia que pretende evitar redução maior do crescimento.
Caso desista da estratégia, deve haver desvalorização do yuan e, de pronto, algum tumulto no mercado, dadas as consequências (algum impacto no comércio mundial, desvalorizações nos países do entorno chinês etc.).
Há, enfim, um medo vago de que se puseram trilhões na especulação com negócios e países de risco, ora mal das pernas, trilhões oferecidos a juro menor que zero pelos BCs. Por aqui, não temos vaga ideia de como o nosso BC relaciona esse tumulto à nossa crise.
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