O GLOBO - 21/02
Prisão do prefeito de Caracas se soma a de outros membros da oposição e empresários, numa escalada repressora proporcional ao descontentamento geral
Aprisão do prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, um dos principais líderes da oposição ao governo de Nicolás Maduro, revela, no recrudescimento da crise venezuelana, a escalada da ação truculenta do Estado. Ledezma foi preso na quinta-feira por cerca de 50 agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin) que invadiram seu gabinete e o levaram para um centro militar, acusando-o de conspirar para derrubar o regime. Segundo a mulher do prefeito, Mitzy, a prisão foi realizada aos empurrões e com disparos de arma de fogo, numa ação em que Ledezma foi agredido.
Como fez Hugo Chávez, seu mentor, Maduro recorre a tramas conspiratórias e ações subversivas para justificar atos de violência institucional. Em cadeia de TV após a prisão, ele acusou Ledezma de fomentar um golpe de Estado. “Chega de vampiros conspirando contra a paz”, disse o presidente venezuelano, referindo-se ao apelido com o qual se refere ao prefeito. Maduro também voltou a acusar o governo americano de ingerência nos assuntos internos do país. Este mês, Washington apresentou sanções contra altos funcionários do governo venezuelano, acusados de reprimir violentamente os protestos do ano passado, que deixaram 45 mortos. Além disso, investiga militares venezuelanos acusados de participar do cartel Los Soles, responsável pelo transporte, no país, de drogas da Colômbia para os EUA.
Não é por acaso que o prefeito de Caracas se une a uma longa lista de opositores presos, entre os quais Leopoldo López, ex-prefeito de Chacao, detido há um ano, durante os protestos; Enzo Scarano, ex-prefeito da cidade de San Diego, um dos epicentros dos protestos; e Daniel Ceballos, ex-prefeito de San Cristóbal. Além destes, María Corina Machado foi cassada da Assembleia Nacional após denunciar na OEA a repressão do regime nos protestos; o governo venezuelano também prendeu empresários, acusados de estocar alimentos, e jovens do movimento estudantil.
A repressão cresce à proporção que a popularidade de Maduro despenca, inclusive em redutos bolivarianos, sob o peso de uma economia em crise aguda, com graves sequelas sociais. A queda dos preços do petróleo e uma política econômica populista geraram uma inflação acima de 60%, a queda do PIB, a desvalorização do bolívar e a escassez de produtos de primeira necessidade. Associada a altos índices de criminalidade, essa situação motivou os protestos do ano passado.
Acuado, o regime se torna cada vez mais intolerante a qualquer situação que possa gerar manifestações. Recentemente, por exemplo, o Parlamento autorizou o uso de armas letais em protestos. A subsecretária de Estado americana para a América Latina, Roberta Jacobson, disse que os EUA estão “profundamente preocupados” com o aumento da repressão. Em contraste, a reação de Unasul, OEA e até do Brasil, tem sido, até agora, desproporcional à escalada da violência do regime. Tal silêncio, se perdurar, corre o risco de transformar esses atores, de mediadores a cúmplices.
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