O GLOBO - 06/02
A nota oficial em que o PT tenta rebater as denúncias de que recebeu dinheiro dos recursos desviados nos escândalos da Petrobras é uma demonstração de como o partido está desnorteado. Afirmar que o "partido recebe apenas doações legais e que são declaradas à Justiça Eleitoral" só pode ser brincadeira, depois que, para se defender no escândalo do mensalão, o PT tentou alegar oficialmente que se tratava "apenas de caixa 2", prática comum na política brasileira, segundo o então presidente Lula. O "dinheiro não contabilizado", na expressão do ex-tesoureiro Delúbio Soares, tornou-se uma pérola inesquecível da baixa política.
Acada dia surge uma nova revelação no escândalo da Petrobras que nos vai dando uma dimensão real do que acontecia na maior estatal brasileira. O que espanta não são os números superlativos, nem o fato de a roubalheira correr solta, pois, com relação à área do petróleo, os contratos são realmente astronômicos, e a corrupção, infelizmente, não é coisa nova entre nós.
Saber, por exemplo, que já em 1997 o ex-gerente Pedro Barusco recebia propina da SBM holandesa não é surpreendente. O que espanta no relato do ex-gerente é como o esquema de corrupção existente anteriormente, em que funcionários corruptos se aproveitavam de sua posição para fazer negócios, transformou-se, a partir de 2004, em política, digamos assim, oficial, com o objetivo de financiar partidos políticos da base aliada do governo, que passaram a ser os canais para a nomeação de diretores e gerentes nas áreas mais vitais da empresa.
E, num ambiente desses, mais que nunca o PT se sobressaiu, recebendo a cifra nada desprezível de US$ 150 milhões a US$ 200 milhões durante esse período, segundo Barusco. O problema para o PT é que a delação premiada pressupõe provas, e Barusco deu várias delas, inclusive uma planilha detalhada com a divisão do butim. E os relatos que se cruzam tornam verossímeis as versões apresentadas por diversos personagens dessa trama macabra.
Augusto Ribeiro Mendonça Neto, proprietário do grupo Toyo Setal, por exemplo, confirmou em audiência na 13ª Vara Federal de Curitiba, na segunda-feira, que o então diretor da área de Engenharia e Serviços da Petrobras, Renato Duque, mandou pagar parte da propina negociada nos contratos fechados com a Petrobras em forma de doação oficial ao PT, e entregou à Polícia Federal depósitos realizados ao PT no valor de R$ 4,26 milhões.
Desde os percentuais que caberiam a cada um, que já haviam sido revelados pelo ex-diretor Paulo Roberto Costa, até detalhes pitorescos, como os apelidos, tudo vai sendo confirmado. O tesoureiro do PT, João Vaccari, levado ontem coercitivamente a depor na Polícia Federal, era o Moch, porque andava sempre com uma mochila. Não é preciso dizer o que levava dentro dela, não é mesmo? Ontem, ao ser encaminhado à Polícia Federal, Vaccari usava a sua indefectível mochila.
My Way, o nome da operação, foi colocado pela PF em homenagem ao apelido de Renato Duque, o diretor que representava os interesses do PT na partilha do butim, o que significa que Duque, mesmo ainda estando em liberdade, já é figura carimbada na investigação.
O ex-gerente que já entrou para o folclore da corrupção ao aceitar devolver US$ 100 milhões (na verdade, pela delação premiada a cifra real é US$ 67 milhões) revela que o seu diretor, Renato Duque, exigia "quinzenadas" de R$ 50 mil retiradas das propinas negociadas. Esse "argent de poche", dinheiro para os gastos mais imediatos, parece nada diante do montante do dinheiro desviado, mas dá a dimensão da grandeza do assalto e da farra com o dinheiro público.
Os 35 anos de criação do PT serão festejados em Belo Horizonte num momento em que o partido chega ao fundo do poço em termos de credibilidade. Claro que Vaccari e outros companheiros serão ovacionados, e provavelmente exortados pelo ex-presidente Lula a não baixarem a cabeça e não se envergonharem da atuação do partido.
Mas nada apagará o fato de que o PT perdeu o controle do Congresso, perdeu o controle da economia e está perdendo o controle da maior estatal brasileira, a Petrobras.
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