O ESTADO DE S.PAULO - 24/08
Nesta fase pré-eleitoral, em que a política se destaca e se sobrepõe à realidade econômica, muitos analistas passaram a comparar o primeiro ano do próximo governo com o primeiro ano de mandato do ex-presidente Lula. Esses dois períodos têm em comum a necessidade de ajustes e correção de rumos depois das turbulências econômicas nos finais de mandato de FHC, em 2002, e de Dilma Rousseff, em 2014. Entre estes analistas está o economista e filósofo Eduardo Gianetti da Fonseca, um livre pensador próximo dos economistas tucanos e, desde a eleição de 2010, conselheiro da candidata Marina Silva. "Lula teve um bom resultado em 2003", lembrou Gianetti há dias, sugerindo dúvidas quanto ao êxito ou fracasso do próximo governante.
Os dois momentos são diferentes. Eleito para governar o Brasil a partir de 2003, Lula era uma caixa de surpresas naquela época: tentou reverter a imagem de incendiário inconsequente, acumulada em muitos anos, assumindo compromissos na Carta ao Povo Brasileiro, em junho de 2002. Mas o mundo econômico, o mercado financeiro, empresários e investidores ainda tinham dúvidas. O fenômeno "pânico Lula" fez dispararem o câmbio, a inflação e a taxa de risco Brasil. Controlar a economia e impedir que o Real descambasse ladeira abaixo foi uma tarefa difícil e custosa para quem comandava a economia em 2002. Armínio Fraga, presidente do Banco Central na época, desabafou um ano depois: "Havia medo em relação ao futuro, mas o futuro não estava em nossas mãos".
E o futuro chegou com Antônio Palocci no comando da economia no primeiro ano de governo Lula. Por indicação do próprio Armínio, Palocci levou para sua equipe economistas que o PT rotulava de neoliberais, ignorou as maluquices econômicas do partido e deu continuidade à política econômica de FHC, por anos condenada pelos petistas. O ajuste se deu pelo freio de arrumação que quase levou à recessão. Mas o resultado foi melhor que o esperado: em 2003 a inflação fechou em 9,3%, abaixo das previsões e acima da meta de 4%; e o PIB cresceu só 0,5%, mas o clima de confiança foi recuperado e as portas começaram a abrir para construir o desenvolvimento - não fossem o mensalão, a vitória de Dilma Rousseff no conflito com Palocci sobre o equilíbrio fiscal e a queda do ministro e de sua equipe de neoliberais.
Agora, em 2014, o momento é diferente: os candidatos são conhecidos e não mais assustam como Lula assustava em 2002. Os problemas são outros e as soluções para eles não constituem nenhum mistério. Até mesmo a candidata Dilma, em cujo mandato esses problemas foram criados ou acentuados, sabe que em 2015 terá de corrigir seus erros se ganhar nas urnas.
Na energia elétrica reinam a confusão, o represamento da tarifa, o endividamento das empresas cresce a galope e a Eletrobrás cambaleia. No petróleo, nem a promissora área do pré-sal salvou - pelo contrário, sobrecarregou - a já combalida Petrobrás, punida com a tarifa congelada e obrigada a multiplicar o endividamento para dar conta de investimentos.
A produtividade do trabalho é rasteira, a geração de empregos perde fôlego, a indústria definha, o custo Brasil é alto, o comércio exterior emagrece e gerar superávit primário para pagar a dívida virou um pesadelo diante de um Estado gastador, com 39 ministérios (12 deles criados por Lula e Dilma) que só produzem disputa e conflitos políticos. Por fim, o crescimento econômico é cada ano mais medíocre, a inflação é persistente e a falta de confiança de empresários e investidores na condução da economia suspende ou adia investimentos - e o País não cresce.
Nenhum dos três candidatos desconhece essa realidade. A diferença entre eles está na escolha dos caminhos de cada um para corrigir os erros. E há enorme desconfiança de quem investe e empurra o progresso para a frente em relação a Dilma Rousseff, que lidera as pesquisas. Ela não mostra, por exemplo, disposição de abrir mão de intervir em negócios privados, método que originou muitos desses erros.
Como Lula em 2003, é dela que vêm as maiores incertezas para 2015.
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