CORREIO BRAZILIENSE - 10/08
Dilma tem que perder para o Brasil ganhar, mudando tudo radicalmente, tarefa que a presidente não fará sob pena de negar totalmente seu primeiro mandato. Esse é o dilema das eleições: mudar ou aprofundar o desastre. Seu governo se diz dos pobres e Marilena Chauí disse, na Convenção do PT, em momento de estupidez, que odiava a classe média. Contudo, o governo de Dilma, na parte tributária, machuca os pobres. Um estudo do professor de direito tributário da UFMG Paulo Adyr, meu ex-aluno do doutorado, prova a afirmação com sobras de mérito.
Reproduzo aqui suas principais conclusões, ao meu sentir, irrespondíveis: A comparação internacional mostra que temos a 12ª maior carga tributária do mundo, atrás apenas da Suécia, da Dinamarca, da França, da Holanda, da Itália, de Israel, da Hungria, do Canadá, da Alemanha, da Polônia e do Reino Unido. E com que países poderíamos nos comparar quanto ao desempenho administrativo? A conclusão é clara: nossa carga tributária, embora não seja a mais alta, é, seguramente, a mais desfavorável do mundo. Ou seja: nenhum país paga tanto por tão pouco.
Cargas elevadas são bem suportadas por países de economia forte. Porém, num país miserável, como o Brasil, tendo em vista nossa capacidade de produzir riquezas, o limite suportável estaria situado em aproximadamente 25%. A tributação que ultrapassa o marco da nossa realidade econômica deságua na informalidade, na ilegalidade, na sonegação e na inibição do crescimento. É precisamente o que está a ocorrer.
Ademais, é gravíssima a ofensa à nossa capacidade contributiva. A grande marca de nosso sistema tributário atual é a regressividade. Num país em que não há renda, a tributação tende a se concentrar sobre o consumo. Nos EUA, 49% da arrecadação é oriunda da renda. No Brasil, 45% da arrecadação incide sobre bens e serviços. Renda e lucros respondem por apenas 19% (e esse patamar somente é atingido porque o Imposto de Renda brasileiro é confiscatório). Intensifica-se, dessa forma, a tributação indireta, que incide pesadamente sobre o pobre. A carga tributária suportada pelas famílias brasileiras que ganham até dois salários mínimos chega a 48%. Para as famílias que ganham 30 salários mínimos, a carga cai para 26%. Quanto mais pobre é o contribuinte brasileiro, maior é o impacto da tributação.
Questão gravíssima é a ofensa à capacidade contributiva das pessoas jurídicas o que se dá por diversas formas. Exemplo claro é a adoção da produção como parâmetro de tributação um dos pontos menos inteligentes na organização de nosso sistema. Receita e faturamento, divorciados da lucratividade, não são manifestações de riqueza. As empresas operam com custos de produção diferenciados. Muitas delas estão a exibir faturamento que, embora expressivo, é superado pela despesa, não há capacidade contributiva alguma. A manifestação não é de riqueza, mas de endividamento. Todavia, PIS e Cofins incidem impiedosamente, empurrando a empresa para o precipício.
Outra forma de agressão à capacidade contributiva reside na cobrança do tributo anteriormente ao fato gerador. Nesse sentido, tem havido redução dos prazos de pagamento. O prazo para o IPI, por exemplo, fixado em 120 dias, foi reduzido para 10 dias. O Imposto de Renda é pago muito antes de se saber qual será o lucro efetivo. A contribuição previdenciária é paga no segundo dia do mês, ocasião em que o fato correspondente (despesa com a folha de pagamento) ainda não ocorreu. E com o mecanismo da substituição tributária para frente, com base de cálculo fixada por presunção frequentemente superior ao montante da operação real. A incidência tributária anterior ao fato econômico implica endividamento da empresa para pagamento do tributo (pois o ingresso correspondente não ocorreu), atingindo o capital de giro imprescindível à própria sobrevivência empresarial. Nada mais desastroso.
Subsiste a cumulatividade na tributação sobre o consumo, a despeito de princípio constitucional que a proíbe. A adoção do sistema de créditos físicos, as restrições do crédito de PIS e Cofins no regime não cumulativo, as contínuas restrições de crédito de ICMS, a cumulatividade econômica remanescente na tributação sobre o consumo, agridem frontalmente a neutralidade de mercado. O tributo que deveria ser suportado pelo consumidor final (pois esse é o mecanismo próprio da tributação sobre o consumo) passa a onerar todas as etapas da cadeia de circulação. Tudo estimula a verticalização das empresas exatamente a contramão da modernização empresarial, num mundo que prega a contínua especialização. Com isso, perdemos competitividade e mergulhamos profundamente no nosso próprio atraso.
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