Este momento que precede a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, merecia ser bem aproveitado pelo País para reflexões a respeito da forma como são escolhidos os integrantes da nossa mais alta Corte. Não interessa aos brasileiros que o Supremo tenha uma composição geradora de desconfianças e descrédito em grande parte da população, como se verifica no presente, merecendo, ao contrário, que todos nos orgulhemos e respeitemos incondicionalmente a escolha dos ministros e suas decisões.
Desde a Constituição de 1946 os ministros do Supremo Tribunal Federal são nomeados pelo presidente da República, dentre brasileiros maiores de 35 anos, com notável saber jurídico e reputação ilibada, após aprovação pelo Senado Federal. Nos dias atuais, infelizmente, verificou-se que esse processo nem sempre levou a sério o necessário saber jurídico, bem como prevaleceu como critério principal a sintonia do escolhido com o grupo político que está no poder.
O Supremo Tribunal é parte do Estado brasileiro e por isso mesmo não é admissível que as escolhas sejam feitas dessa forma, por um governo, que é passageiro (além de sofrível) e com essa conduta exprime desprezo por reais atributos e aptidão para a tarefa de julgar.
Algumas escolhas difundiram a ideia de que havia interesse em colocar no Supremo pessoas confiáveis não para o País, mas para quem os indicava. Como estava em julgamento o processo do mensalão, que expunha os crimes praticados por elementos de cúpula do Partido dos Trabalhadores (PT), pareceu haver o empenho de constituir uma maioria capaz de se opor ao rigorismo do ministro Joaquim Barbosa. Pelo jeito, deu certo.
Chegou-se ao extremo de indicar para a Suprema Corte do País um ministro bastante jovem que havia prestado concurso para ingresso na magistratura de São Paulo e fora reprovado. Incrível, o não saber jurídico não foi nenhum obstáculo para a sua nomeação, porque outra credencial havia para lhe garantir a vaga: tratava-se do fato de ele ter sido advogado do PT.
Esse partido está no governo federal, ali chegou pelo voto e é normal que aproveite essa embriaguez do poder enquanto puder. Todavia, por questão de respeito ao Brasil e aos brasileiros, não deveriam ter sido feitas indicações que pareceram destinadas, desde o início, a uma conduta esperada dos indicados: a de que não falhassem no julgamento do mensalão.
Isso veio a acontecer, nenhum deles falhou, deixando a clara impressão de haverem pago obedientemente o favor da nomeação. Para os que amam o Direito e a Justiça, é muito triste verificar que essa imagem de submissão, de subserviência, acabou mesmo prevalecendo.
Em determinado momento do julgamento do mensalão, quando os 11 ministros do Supremo julgavam os embargos infringentes propostos por José Dirceu e outros petistas condenados, percebeu-se a formação de maioria favorável ao abrandamento das penas, mesmo diante da oposição vigorosa do ministro Joaquim Barbosa. Em gesto de extrema boa vontade, e de absoluta isenção, talvez se possa admitir que os componentes dessa maioria tenham votado, naquela ocasião, segundo suas próprias convicções. Mas mesmo que eles jurem, ao pé da cruz, que votaram segundo suas convicções jurídicas, prevaleceu em muitos milhões de brasileiros (quem sabe, a maioria) a ideia contrária, ou seja, a de que cuidaram de "livrar a cara" de José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha e outros.
O ocorrido ensina que convém à Nação meditar sobre o critério de escolha dos ministros do Supremo Tribunal Federal e mesmo modificá-lo. Não é admissível que prevaleça a versão atual de que alguns ministros, formando bloco vencedor, estejam pagando com suas decisões o favor da nomeação para o cargo. A ideia de que isso possa ter ocorrido traz em si gigantesca dose de insuportabilidade, porque, afinal, estamos tratando da mais alta Corte do País.
Semanas atrás, o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador José Renato Nalini, recebeu a visita da cúpula de governo da Coreia do Sul e ficou impressionado com a eficiência do sistema de escolha de ministros para o principal tribunal desse país. Lá existe uma alternância nas indicações, distribuídas entre o próprio tribunal, o Executivo e o Legislativo. Tal sistema afasta a ideia de que as decisões possam refletir interesses pessoais.
Neste momento de predomínio do PT no Congresso Nacional, torna-se inimaginável admitir uma modificação constitucional capaz de permitir forma menos vulnerável de escolha de nossos ministros. Isso abre caminho para que a próxima escolha traduza, outra vez, interesses políticos, e não a melhor habilitação do escolhido.
O ministro Joaquim Barbosa, que ainda teria mais 11 anos no Supremo, ao anunciar sua precoce aposentadoria fez milhões de pessoas se indagarem: quais os reais motivos de deixar tão importante cargo? É bastante provável que na raiz de sua decisão esteja a comprovação, por ele aferida, de que acabou constituído na Corte Suprema um bloco majoritário composto por seis ministros que poderiam derrotá-lo sempre nas votações que envolvessem os interesses de José Dirceu, José Genoino, João Paulo Cunha e outros.
O julgamento de mérito do mensalão terminou, mas nesta fase de execução das penalidades são corriqueiros incidentes cuja competência para decidir monocraticamente é do presidente do tribunal, que a partir de agosto será o ministro Ricardo Lewandowski. Esse ministro deixou a sua marca naquele julgamento, mostrando-se na grande maioria das decisões a favor da absolvição ou de brandas condenações para os réus do Partido dos Trabalhadores, alguns dos quais haviam defendido, anteriormente, a sua indicação para o Supremo.
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