CORREIO BRAZILIENSE - 23/06
A crise da dívida da Argentina ganhou um novo e emocionante capítulo na semana passada, mas está longe do epílogo. Norte-americanos que detêm títulos da nação do Cone Sul foram favorecidos por decisão da Justiça que lhes proporcionará US$ 1,33 bilhão. Estima-se que o montante devido a esses fundos seja de US$ 15 bilhões.
Os investidores sabem, porém, que não conseguirão obter tudo a que têm direito legalmente. Isso significaria receber dos argentinos o valor de face dos papéis, sobre o qual foram aplicados descontos que chegaram a 70% na reestruturação dos débitos do país após o calote de 2001.
O problema não está tanto no desembolso em questão, mas no que ele representa para o restante dos credores. Voltar atrás no que foi pactuado envolve algo superior a US$ 200 bilhões, em um país que tem hoje reservas de US$ 28 bilhões.
Representantes dos fundos têm dito que se dispõem a discutir. Afinal, eles não pagaram o valor integral dos títulos, comprados com o desconto posterior à reestruturação. Querem receber mais do que desembolsaram, e quanto mais conseguirem, melhor. Mas não se pode esquecer de que no mundo das finanças impera o pragmatismo. Os fundos, chamados abutres por mirarem a escória dos papéis do mercado, querem é lucrar, se possível rapidamente.
Por outro lado, o governo argentino sabe que não pode ignorar a decisão da Justiça norte-americana. Terá de dar alguma demonstração de boa vontade, na forma de pagamentos maiores do que os previstos no acordo que já havia sido pactuado.
O sucesso dessa nova etapa é, porém, altamente incerto, tanto no que se refere ao tempo quanto ao resultado. O governo argentino tem dado poucos sinais de que pretende usar transparência e objetividade no processo, algo que poderia melhorar suas chances. Na semana passada, o Ministério da Economia negou que estava enviando aos Estados Unidos uma missão para tratar do assunto. Depois voltou atrás e confirmou a viagem.
No fim de semana, a presidente Cristina Kirchner publicou na imprensa norte-americana um anúncio em que diz que os fundos "investiram milhões em lobby e propaganda, tentando fazer o mundo todo acreditar que a Argentina não paga suas dívidas e se recusa a negociar".
É ingênuo acreditar que será possível convencer a opinião pública dos Estados Unidos e, desse modo, fazer com que juízes e investidores mudem de ideia. Mesmo que gastasse toda a reserva cambial do país, a Casa Rosada talvez não conseguisse tal objetivo.
Pautar-se pela razão é algo necessário não só aos líderes do país vizinho, mas também ao governo brasileiro. Pode custar caro, do ponto de vista político, ajudar o aliado do Mercosul com recursos ou com apoio formal neste momento.
Ao prejudicar um de nossos principais parceiros econômicos, a crise terá impactos aqui, ainda que limitados. Mas proporciona também efeito benéfico do lado de cá da fronteira. Cala, ao menos por ora, as vozes que viam no calote e no desconto com a restruturação da década passada algo invejável, uma referência a ser replicada. Como na natureza, nas finanças os abutres podem ser desagradáveis, mas têm sua função.
Os investidores sabem, porém, que não conseguirão obter tudo a que têm direito legalmente. Isso significaria receber dos argentinos o valor de face dos papéis, sobre o qual foram aplicados descontos que chegaram a 70% na reestruturação dos débitos do país após o calote de 2001.
O problema não está tanto no desembolso em questão, mas no que ele representa para o restante dos credores. Voltar atrás no que foi pactuado envolve algo superior a US$ 200 bilhões, em um país que tem hoje reservas de US$ 28 bilhões.
Representantes dos fundos têm dito que se dispõem a discutir. Afinal, eles não pagaram o valor integral dos títulos, comprados com o desconto posterior à reestruturação. Querem receber mais do que desembolsaram, e quanto mais conseguirem, melhor. Mas não se pode esquecer de que no mundo das finanças impera o pragmatismo. Os fundos, chamados abutres por mirarem a escória dos papéis do mercado, querem é lucrar, se possível rapidamente.
Por outro lado, o governo argentino sabe que não pode ignorar a decisão da Justiça norte-americana. Terá de dar alguma demonstração de boa vontade, na forma de pagamentos maiores do que os previstos no acordo que já havia sido pactuado.
O sucesso dessa nova etapa é, porém, altamente incerto, tanto no que se refere ao tempo quanto ao resultado. O governo argentino tem dado poucos sinais de que pretende usar transparência e objetividade no processo, algo que poderia melhorar suas chances. Na semana passada, o Ministério da Economia negou que estava enviando aos Estados Unidos uma missão para tratar do assunto. Depois voltou atrás e confirmou a viagem.
No fim de semana, a presidente Cristina Kirchner publicou na imprensa norte-americana um anúncio em que diz que os fundos "investiram milhões em lobby e propaganda, tentando fazer o mundo todo acreditar que a Argentina não paga suas dívidas e se recusa a negociar".
É ingênuo acreditar que será possível convencer a opinião pública dos Estados Unidos e, desse modo, fazer com que juízes e investidores mudem de ideia. Mesmo que gastasse toda a reserva cambial do país, a Casa Rosada talvez não conseguisse tal objetivo.
Pautar-se pela razão é algo necessário não só aos líderes do país vizinho, mas também ao governo brasileiro. Pode custar caro, do ponto de vista político, ajudar o aliado do Mercosul com recursos ou com apoio formal neste momento.
Ao prejudicar um de nossos principais parceiros econômicos, a crise terá impactos aqui, ainda que limitados. Mas proporciona também efeito benéfico do lado de cá da fronteira. Cala, ao menos por ora, as vozes que viam no calote e no desconto com a restruturação da década passada algo invejável, uma referência a ser replicada. Como na natureza, nas finanças os abutres podem ser desagradáveis, mas têm sua função.
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