O Estado de S.Paulo - 06/05
Apesar de a taxa de juros básica da economia (Selic) ter sido aumentada em 3,75 pontos de porcentagem, para 11% ao ano, a taxa de inflação do Brasil pouco se moveu e as expectativas para a inflação para os próximos anos continuaram a aumentar. Com isto, já começam a aparecer análises sugerindo que a política monetária tem pouco ou nenhum efeito no País, seja porque a política fiscal é expansionista, seja porque as práticas passadas de indexação aumentam a rigidez inflacionária e tornam a taxa de inflação menos sensível a aumentos da taxa de juros. E, como a política monetária é ineficiente no combate à inflação, o Banco Central deveria encerrar o ciclo de aumentos da Selic.
Uma política fiscal menos expansionista seria de grande importância para ajudar no combate à inflação. Sem dúvida, uma das razões pela qual a taxa de inflação ainda não mostrou sinais de arrefecimento é a política fiscal expansionista. Mas isto apenas significa que, dada a política fiscal, a taxa de juros está ainda muito baixa, apesar dos aumentos já realizados.
Porém, três outros fatores estão gerando uma maior rigidez das expectativas para a inflação no atual ciclo de política monetária, se comparado a ciclos anteriores. Primeiro, porque declarações de membros da diretoria do Banco Central sugerem que a autoridade monetária está convencida de que a inflação já está em desaceleração e isto somente não aparece nos índices porque o País tem sido submetido a choques de oferta sistemáticos (alimentos, por exemplo) e fora do controle da política monetária. Assim que estes choques de oferta saírem do horizonte, os índices de inflação vão convergir para a meta. A mensagem subjacente é que o Banco Central está sempre próximo a parar o aperto monetário e somente não o faz porque os choques de oferta não permitem.
Entretanto, como os núcleos da inflação também estão pressionados, seis de nove grupos de produtos do índice de inflação estão acima do teto do intervalo de metas, os preços dos serviços estão correndo na casa dos 9% ao ano, o Relatório Trimestral de Inflação do primeiro trimestre de 2014 estimou em 38% a probabilidade de a inflação estourar o teto do intervalo de metas em 2014, além de outros fatores, o sentimento na sociedade é de que a inflação no Brasil é um fenômeno generalizado, decorrente de desequilíbrios entre oferta e procura e não de choques de oferta.
Na verdade, o sentimento é de que a inflação somente está abaixo do teto do intervalo de metas porque o governo promoveu um "choque de oferta negativo", controlando preços administrados (combustíveis, energia elétrica, transportes urbanos), o que tirou cerca de 2,0 pontos de porcentagem da taxa de inflação no ano. Dada esta discrepância entre as avaliações da sociedade e do Banco Central, as expectativas para a inflação futura nunca convergem para o centro do intervalo de metas, permanecendo teimosamente próximas ao teto do intervalo. O resultado é mais rigidez da taxa de inflação.
O segundo fator é o controle de preços administrados que, em algum momento, terá de ser revertido e irá fatalmente gerar aceleração inflacionária no futuro. A rigidez das expectativas está, em parte, antecipando esta aceleração. Finalmente, as declarações da equipe econômica têm sido de pouca ajuda. A especulação de que o governo estaria estudando retirar os preços dos alimentos do cálculo da inflação certamente não ajudou. Porém, a declaração do ministro da Fazenda, Guido Mantega (2/4/2014), de que "mesmo que haja inflação, o importante é que o poder aquisitivo da população esteja crescendo mais do que essa inflação, que ocorre normalmente todo ano", sugere que qualquer nível de inflação é aceitável, desde que os salários nominais cresçam mais do que os preços. Interpretada ao pé da letra, a declaração é um convite a uma espiral entre salários e preços e, portanto, forte tendência à aceleração inflacionária no futuro. Diante desse cenário, aumentam as expectativas quanto à inflação futura e maior a taxa de juros real necessária para se conseguir obter o mesmo resultado sobre a inflação presente.
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